quarta-feira, 27 de setembro de 2017

O factoide dos "recibos de Lula", por Sergio Saraiva

Da ficha falsa de Dilma aos "recibos de Lula", mais um caso onde a mídia se permite manipular informações.
recibo de Lula 5
O factoide dos "recibos de Lula"
por Sergio Saraiva
Excitada por manchetes de jornais, as redes sociais estiveram agitadas com os "recibos do Lula".  Dois deles apresentavam datas que não existem no calendário, tais como, 31 de junho ou 31 de novembro. Seriam evidências de falsificação dos documentos.
Pouco adiantou lembrar que quem assina os recibos é o locador. Aliás, justamente a pessoa que acusava Lula de não ter pagos os aluguéis. Logo, se as assinaturas não são falsas, e até agora ninguém disse que não sejam verdadeiras, o erro seria dele - do proprietário do apartamento - e não de Lula.
Mas, na verdade, a explicação para os tais recibos com datas incoerentes provavelmente é trivial. O segredo por traz do recibos de Lula nada tem de secreto. É apenas mais um erro de “Ctrl C + Ctrl V” – os comandos para copiar e colar dos programas de computador.
Aparentemente, Glauco da Costamarques – a pessoa que assina os recibos – utilizava-se de um “template”. Um modelo padrão de recibo repetido todos os meses apenas com a alteração do valor e do mês de recebimento. Mas mantido o mesmo texto, inclusive dia do mês – sempre o mesmo dia 31.
Basta comparar dois recibos colhidos ao acaso para verificar a semelhança dos textos.
Janeiro de 2014:recibo de lula 3
E o mesmo texto repetido 7 meses depois, em agosto de 2014. Alterado o mês mas não o dia do mês. Sempre o mesmo dia 31.
recibo lula 4
Não seria de se estranhar a existência de um recibo com a data de 31 de fevereiro.
Espantoso é que algo assim tão simples de se constatar tenha passado "desapercebido" dos editores da nossa mídia que mandaram ver sem piedade: "Lula apresenta recibos de aluguel com datas que não existem".
O que fazer?
Apenas mais um caso de manipulação da informação.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

O país das Rocinhas - Janio de Freitas, FSP, 24/9/2017


O país das Rocinhas - Janio de Freitas, FSP, 24/9/2017
O espanto generalizado com a guerra na Rocinha só pode vir do vício de espantar-se com os atos todos da violência urbana, não importa se maiores ou minúsculos, se astuciosos ou vulgares. Rocinha não é mais do que uma celebridade (a palavra-símbolo do jornalismo deslumbrado) entre milhares de assemelhadas pelo país afora.
Na Rocinha há fuzis modernos, sim. Em Brasília, os equivalentes aos criminosos da Rocinha têm a mais abrangente e terrível das armas: o poder –de governar em benefício de grupos, de legislar em causa própria e dos subornadores, de queimar uns poucos comparsas e preservar o grosso da bandidagem engravatada.
Se é assim no cimo do país, onde também se travam lutas por mais domínio, o que esperar dos que têm a mesma índole sem, no entanto, receberem da vida as mesmas oportunidades? Assalto por assalto, dos cofres públicos é roubado muito mais, nem se sabe quantas centenas de bilhões, do que o dinheirinho de passantes, o troco das caixas de lojas, os celulares, relógios e carros.
Há as drogas. Todas as Rocinhas são dadas como entrepostos de droga. São vendedoras. Inclusive para os consumidores armados de poder e seus sócios no elitismo. Nas Rocinhas, vem em papelotes. Nas festas da fortuna, a droga vem em bandejinhas de prata. Elegância e poder não costumam andar juntos, mas às vezes coincidem.
O tráfico proveniente das Rocinhas é uma desgraça. Há, porém, um tráfico mais devastador. O tráfico de drogas destrói indivíduos, o tráfico de influência nos gabinetes e salões do poder arrasa multidões, mais de 200 milhões de seres roubados em dinheiro e em direitos pelos negócios do suborno e da influência.
Os delinquentes de todas as Rocinhas matam. Muito. E o fazem, é verdade, com indiferença e perversidade. Pensar que a airosa Fortaleza é a quinta entre as dez cidades mais violentas das Américas, sendo o Rio a décima e última, parece estatística de economista.
O homicídio originário das Rocinhas cresce e se espalha, incontrolável. Em paralelo ao homicídio que não leva esse nome, para proteger seus culpados. E que assassina com as armas letais que são a ausência de remédios para transplantados, HIV, diabéticos, tuberculosos, cardíacos, e tantos mais, por "falta de verba" que ricaços no poder cortaram.
Quando não é a morte assim, é a tortura pela espera de leito hospitalar, pelos meses à espera de um teste de câncer, pelos meses à espera da cirurgia. Pela espera impiedosa da morte. Decretada nas altitudes luxuosas de Brasília, nas roubalheiras cabralinas não só fluminenses, e muitas vezes autorizadas pela maioria de travestis do Congresso –bandidos passando-se por representantes do povo. Os homicídios dos delinquentes das Rocinhas em geral são muito menos numerosos.
A insegurança urbana é indignante e injusta. Até filas de emprego são assaltadas, bandidos pobres roubando pobres trabalhadores. Mas a delinquência que sai das Rocinhas, e transtorna as suas cidades, generaliza espantos e horrores. Uma caverna com R$ 51 milhões tomados pela delinquência armada de poder político, ah, essa excita o bom humor. E a criminalidade das Rocinhas não é subproduto da delinquência engravatada, indiferente às suas vítimas tal como a delinquência urbana? Ambas tão comuns, tão antigas, consanguíneas, diferentes apenas na extensão em que infelicitam o presente e o futuro país.
COMO SEMPRE
Apesar das muitas críticas ao governador Luiz Fernando Pezão, ao proibir a intervenção policial na guerra de bandos, domingo passado na Rocinha, ele por certo evitou uma mortandade inútil no que seriam os três lados do tiroteio. E, pior, nos alvejados pelas ditas balas perdidas.
Na intervenção agora consumada, mais uma vez o Exército mostra, desde as primeiras decisões, que ainda não compreendeu o problema e, portanto, as suas possibilidades. Erros que se repetem desde a cúpula ambiental Rio-92. É demais.

Jessé: classe média pensa que é elite

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Nenhum texto alternativo automático disponível.
A imagem pode conter: 2 pessoas, texto

Jô virou o Judas do momento ( Roberto Gomes Zanin)

Jô virou o Judas do momento
Jô fez 1 a 0. Começava o auê.
Foto: Daniel Augusto Jr. / Agência Corinthians
Vivemos em um tempo doente.
Tempo em que democracia só é boa quando está a meu favor.
Tempo de redes sociais, em que qualquer valente à distância se julga no direito de julgar (e quase sempre, condenar) os atos de outrem.
O lance do gol do Jô demonstra isso.
“Mau caráter”, “fariseu”, “nunca será um Rodrigo Caio”, etc., tornaram o atacante o Judas da vez.
Jô seria o reflexo da corrupção no país, culpado pelos mensalões, petrolões, Geddéis, Joesleys, malas de dinheiro, etc.
Só falta sugerirem que ele faça um acordo de delação premiada.
O cara tomou uma rasteira do Anderson Martins e sofreu pênalti.
O zagueiro chamou o árbitro para se acusar? Não!
Quem sou eu para julgar o que se passou na cabeça dele no lance do gol?
Mas é isso. Nesses tempos difíceis, o computador, a paixão e o ódio amplificam tudo, com barulho sem precedentes.
Ainda mais quando o assunto é o Corinthians.
Se eu fosse o presidente do clube, convocaria uma coletiva propondo que se cobre o pênalti sofrido por Jô e que se anule o gol que gerou tanto mimimi.
Na pior das hipóteses, o Corinthians ficaria com oito pontos de vantagem na liderança, distância que ainda tornaria impossível ouvir o chororô de quem está lá atrás.
Não iria dar em nada. Mas seria interessante.
Gostei da atuação da equipe, principalmente no segundo tempo.
Domingo, temos que entrar com tudo (não como fizemos contra o Santos).
Derrotar o SPFC significa passo gigantesco para o título e nossa contribuição para o rebaixamento do rival, que tratará o jogo como uma guerra.

Hipocrisia, caráter e futebol ( Marco Bello)


Hipocrisia, caráter e futebol
O atacante Jô é o centro da polêmica após ter marcado o gol da vitória do Timão
Foto: Daniel Augusto Jr. / Agência Corinthians


Hipocrisia: ato ou efeito de fingir, de dissimular intenções, fingimento, falsidade.
Caráter: é dito do bom caráter uma pessoa moralmente correta, com atitudes respeitosas e dignas.
Futebol: esporte cujo objetivo é fazer entrar uma bola no gol do adversário.
Pois é, estas três palavras estão no centro da polêmica esportiva nacional após mais uma rodada do Campeonato Brasileiro.
Vamos usá-las a seguir.
Do começo
Jô fez um gol irregular. Usou o braço. O árbitro Elmo Resende Cunha e sua trupe erraram.
Do meio
Parte 1: Jô fez o que se espera de um atacante: gol. Como se faz o gol? Com o pé, a mão, a cabeça, o bumbum, a ponta do dedo mindinho, não importa. Ele é pago para fazer gols.
Parte 2: O árbitro tem a função de dizer se o que o jogador fez é legal ou ilegal. O árbitro validando o lance, o jogador pode comemorar.
Parte 3: O adversário tem o direito de reclamar, desde que observando o respeito para o sexteto de arbitragem. Se conseguir com que o árbitro reveja a decisão, melhor. Se não, deve continuar jogando.
Parte 4: A torcida tem que comemorar. Gol é gol. Impedido, com o pé, com a mão, o torcedor quer ganhar e ponto.
Parte 5: A imprensa tem o direito de opinar. Desde que se respeite os limites entre a observação futebolística e a crítica pessoal por clubismo, perseguição ou discriminação por qualquer outro motivo. O jornalista tem que ser imparcial, isento e coerente. Tem que manter a opinião ou pelo menos explicar possíveis mudanças com argumentos.
Do fim
Caráter se mede em casa. Na família. Nas atitudes cotidianas. No amor pelo próximo. Na coerência entre o que se diz e o que se faz.
Esta incoerência de alguns tem um nome: hipocrisia. Infelizmente muito utilizada hoje em dia.
futebol é um esporte apaixonante por causa disso. Erros, acertos, gols e jogadas polêmicas. Discussões e brigas que fazem parte do jogo. São guerreiros, dentro de campo.
Após o apito final, são homens. Seres humanos com virtudes e defeitos como eu e você

Brasil: a terra dos anjos do futebol

Brasil: a terra dos anjos do futebol
Atletas do Brasil: a ética em primeiro lugar
Foto: Composição Digital
É uma beleza, torcida brasileira! Em um país marcado pela honestidade, pela ética e pela franqueza, da política ao esporte, convém lembrar dos virtuosos atletas que advertiram os árbitros de seus ilícitos esportivos.
Vale lembrar do probo Nilton Santos, na Copa do Chile, em 1962. Depois de derrubar o espanhol Collar dentro da área, o lateral deu dois passos para trás, convocou o senhor do apito e confessou: “cometi o pênalti”.
Como sabemos, a Espanha marcou e venceu o jogo. O Brasil se complicou e não conquistou o que seria seu bicampeonato mundial.
Mais vivas ao notável Luizão, que podia cavar um pênalti para o selecionado canarinho, em 2002, no prélio contra a Turquia.
No entanto, após desabar em ação ofensiva, o atacante ergueu-se convicto do gramado e convenceu o árbitro sul-coreano Kim Young Joo de que a infração ocorrera fora da grande área.
Foi quando o Brasil de Felipão começou a se complicar naquela Copa... Há culpa também de Rivaldo, que bem poderia ter armado uma cena depois do chute de Hakan Unsal.
Valia simular uma bolada no rosto e induzir o árbitro a expulsar o adversário. Rivaldo, entretanto, amante do fair play, evitou o teatro e permitiu que os turcos se armassem para conquistar a vitória.
Outro admirável beato pátrio é Roque Jr. Na mesma competição, o belga Wilmots anotou um gol quando a partida ainda patinava no 0 a 0. O juizão quis invalidar o lance, assinalando falta no defensor.
Firme em seus valores, no entanto, Roque Jr. discutiu com o árbitro e exigiu a validação do tento adversário. E foi assim que o Brasil naufragou naquela Copa do Mundo.
São muitos os exemplos de virtude no futebol brasileiro, sempre lembrados e elogiados por nossa valorosa crônica esportiva.
Que nos lembremos de Túlio, que ajeitou com o braço para marcar pela Seleção contra a Argentina, na Copa América de 1995. Segundos depois, no entanto, arrependeu-se e exortou o árbitro a anular seu tento decisivo. Naufragamos, mas com dignidade.
E o que dizer do grande Fred na Copa do Mundo de 2014? Percebendo que o croata não cometera o pênalti, convocou o árbitro japonês Yuichi Nishimura para uma conversa e o persuadiu a esquecer o lance.
São tantos os eventos desta natureza que nos falta a memória. Lembremo-nos da partida do Paulistão de 2010 em que o menino de ouro do Brasil, Neymar, mandou para as redes com o braço, em um peixinho espetacular.
Em seguida, em demonstração de respeito aos colegas de trabalho tricolores, obrigou o árbitro a assinalar uma falta, e não o tento.
Em tempo recente, em São Januário, Luis Fabiano empenhou-se em tarefa parecida, depois de contar com a ajuda do braço para vencer Cassio.
Assim, a partida terminou em 1 a 5 para a equipe mosqueteira paulista.
É uma pena que o corinthiano Jô se ponha a macular, com triste pioneirismo, essa história de verdadeiras vestais do ludopédio nacional.
Jô, ainda há tempo para a contrição. Empenhe-se. As asas vêm!

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Caetano Veloso - Rosa (Pixinguinha)

Jô e o país dos indignados seletivos

Jô e o país dos indignados seletivos
Braço aqui também: neste caso, sem chilique da crônica esportiva
Foto: Reprodução TV
Fato histórico: o Corinthians surgiu, em 1910, contra tudo e contra todos, atrevendo-se a exibir virtudes em um esporte controlado pelas elites. Expôs à ribalta do ludopédio os rebeldes jovens da Várzea do Carmo, como Neco e Apparício.
Na época, a prática do futebol oficial era privilégio dos bacharéis e dos bem-nascidos, descendentes dos barões do café e dos controladores do nascente parque industrial nacional.
Não à toa, portanto, o Corinthians sempre foi visto pela mídia bandeirante como um penetra na festa chique, agregando ao esporte bretão incômodos operários, pequenos comerciantes, prestadores de serviços, estudantes inquietos e lavadeiras sem papas na língua.
Em 1913, o jornal “O Imparcial” já afirmava que o entusiasmo pelo futebol parecia minguar. Motivo alegado: a invasão da plebe.
E define: “...apesar do Corinthians ser um team valoroso, seria melhor distribuir seus jogadores entre os clubes”.
Desde essa época, as vozes da tradição quatrocentona têm sido implacáveis com o Corinthians e os corinthianos, time considerado representante dos “suados”, da “pretalhada”, dos “carroceiros”, dos “anarquistas”, sempre em tom pejorativo.
Neste 107 anos, o Corinthians constituiu uma espetacular mescla de fiéis, incorporando massivamente os mais humildes, mas também muitos daqueles em posição de destaque no campo socioeconômico.
Em tempos remotos, angariamos já a adesão de figuras de destaque, como o jurista Alcântara Machado (um dos responsáveis pela cessão do terreno do estádio da Ponte Grande) e o empresário Alfredo Schürig.
Pouco se alterou, no entanto, a postura preconceituosa de parte da crônica esportiva. É implacável com o Corinthians; complacente com outras associações desportivas.
Mimimi da turma de Parque São Jorge? Não! O Corinthians foi prejudicado pela arbitragem inúmeras vezes, mas esses episódios raramente ganham notoriedade.
O contrário, sim. Até hoje, por exemplo, difundem-se textos e mais textos sobre o suposto gol de mão corinthiano, anotado por Carlito, na decisão do Paulista 1938, contra o São Paulo.
O estigma atual deriva fortemente da campanha movida pelo jornalista-publicitário Milton Neves, que associou aos mosqueteiros a maldosa expressão “apito amigo”.
Outro episódio que muito contribuiu para a atual onda de indignação seletiva foi o desenrolar do Campeonato Brasileiro de 2005.
Já mostramos em coluna anterior que, naquele certame, a bronca está centrada no lance que resultou na expulsão de Tinga, na partida finalizada em 1 a 1, no Pacaembu.
Naquele mesmo campeonato, no entanto, não houve alarde sobre as nove partidas em que o Internacional foi beneficiado pela arbitragem, tampouco em outras nove nas quais o Corinthians foi prejudicado.
A mídia de moral seletiva não bradou contra a arbitragem que, naquele ano, desconheceu o impedimento na jogada que definiu a vitória dos colorados sobre o Brasiliense.
No jogo derradeiro do alvinegro, pouco se ouviu sobre o gol goiano, anotado por Souza, em posição de impedimento.
É também estranho que o suposto clube do “apito amigo” tenha passado mais de 22 anos em jejum de títulos importantes.
Ou que se tenha abandonado às vilanias do desonesto Amarilla, em 2013, em uma das arbitragens mais escandalosas de todos os tempos.
Se tratamos do atual Campeonato Brasileiro, onde se viu faniquito do impoluto Mauro Cezar Pereira depois que a arbitragem invalidou gol legal do mesmo Jô contra o Coritiba?
O mesmo avante corinthiano, aliás, teve outro tento justo embolsado pelos apitadores, no empate em 1 a 1 contra o Flamengo, na Arena de Itaquera.
E quem viu chilique depois da mão de Luis Fabiano num dos tentos cruzmaltinos nos 2 a 5 do primeiro turno?
Viu o dedo apontado? Desconfie. Esta é a terra dos fariseus!

O papel dignificante e contraditório de Lula diante do inevitável, por Armando Coelho Neto

O papel dignificante e contraditório de Lula diante do inevitável
por Armando Rodrigues Coelho Neto
“Delegado da PF não sabe explicar por que chamou Lula para falar sobre MP editada por FHC”. Este é o título de um vídeo que circula nas redes sociais no qual o deputado federal Paulo Pimenta (PT/RS) destroça a convocação do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva para depor sobre uma Medida Provisória editada  pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Incisivo, o deputado quis saber do servidor da PF, sobre seu desinteresse dele em não ouvir FHC, mas quis ouvir Lula. Não se interessou em saber se, à época da edição da MP, alguma empresa ou parente de FHC se beneficiou de alguma forma, nem se as empresas liberaram verba para o Instituto Fernando Henrique Cardoso. Menos ainda quem foram os parlamentares e que benefícios tiveram...
Uma série de constrangidos “nãos” foram as respostas do delegado da PF. É como se só vislumbrasse crime no Lula, levando o deputado Pimenta a concluir pela pública e notória perseguição ao ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva.
A delimitação do trabalho da Farsa Jato no tempo, espaço e pessoas é prova insofismável do descrédito e ou desqualificação da maior farsa jurídica da história do Brasil. Entretanto, quanto mais chafurdam o submundo da esquálida democracia brasileira, menos PT é encontrado e mais seus oficiantes se deparam com a sociedade que a Farsa Jato e seus simpatizantes se alinham. Uma sociedade na qual a palavra “querida” é uma ofensa ao Ministério Público Federal, durante uma audiência. Leia-se a barnabé da Farsa Jato queria o mesmo tratamento que é dado a um vereador semianalfabeto (excelência).
Coisas de uma sociedade na qual dizer que “juiz não é Deus” é crime de desacato e um desses quase deuses chegou a processar um porteiro de prédio por não o chamar de doutor. Uma sociedade no melhor estilo “Você sabe com quem está falando?”.
A rigor, a Farsa Jato é sadomasoquista, pois bate no que nutre a sociedade que ela integra e cujos vícios finge combater. Farta de acólitos de aparências, há pouco espaço para moral e mais vive de falso moralismo e sonegação fiscal. Nessa sociedade, uma petição ingressada numa repartição pública não recebe um carimbo sem que se “molhe a mão de alguém”. Mas, o Partido dos Trabalhadores foi eleito para simbolizar essa podridão, por ter seguido a regra social. Daí que deixo no ar um tema que no Direito Penal é chamado de “Inexigibilidade de Conduta Diversa”, que é uma causa supralegal de exclusão da culpabilidade, aulinha básica que Moro e Dalagnol faltaram. Seria possível o PT fazer campanha e governar sem dinheiro e sem comprar votos? Qual a opção que a sociedade de Moros, Marinhos e Malafaias oferece?
Eis que a horda de paneleiros antes moralista está silente. Seja porque o motivo não era nem econômico nem moral, seja por vergonha de admitir que foi às ruas de verde e amarelo, camisa de CBF para beija pato, convocado por Aécio e Gedel, enganada por Vejas, Istoé, Folhas, Globos et caterva.
A horda verde-amarela deu suporte popular ao golpe de estado que, com a complacência do Ministério Público e do Poder Judiciário, entregou o comando da Nação a uma quadrilha. Nela, Gedel, PMDB, Odebrecht, Moros, Marinhos e Malafaias são instrumentos naturais de sustentação de um modelo social, político e econômico podre que não se pode discutir. Quem tentar fazê-lo terá que ouvir Vai pra Cuba, Venezuela ou Coreia do Norte!
Os manipuladores da horda fazem política negando a política, tentando vender a ideia de gestores, num cínico processo de mexer em tudo, expurgar o que lhes convém para que tudo fique exatamente como está. E assim, um barquinho de lata tem mais horas de cobertura jornalística do que 51 milhões amofumbados, sob a espreita de um ladrão que gritou ser necessário “combater a roubalheira do PT”. E o mais grave: a foto dos milhões serviu de ilustração para atacar Lula/Dilma. A mídia que faz isso é a mesma que idolatra a Farsa Jato e seus oficiantes. Daí que ficar difícil separar o joio do trigo. Parece tudo uma hipocrisia só.
É a parcialidade mostrada por Pimenta lá em cima. É o jogo de cartas marcadas cuja lado tosco recente é o ex-ministro Antonio Palocci. Acuado, sob tortura e pressão do cárcere indefinido, deu um testemunho linear supervalorizando o óbvio, sobre o “sempre se soube”. Monocórdio e modorrento, não sei se Palocci precisou de marqueteiro para depor. Mas, usou expressões de efeito jornalístico capazes de gerar manchetes. Com direito a risadinha, engasgo, suspiro ou satisfação de Sérgio Moro, disse “não sou santo”. Depois, surgiram “fratura exposta”, “operação Tabajara“´, “pacote de propina” até resvalar na mais glamorosa - o tal “pacto de sangue”. Tudo para dar suporte e credibilidade ao disse-me-disse sobre a bajulação presidencial, na qual o Ministério Público, entre documentos apócrifos, cifras indefinidas e reuniões das quais o Palocci não participou, quer encontrar crime.
Depois veio Lula, que quase fez da audiência a continuação da caravana da democracia. Todo bandido acuado diante das excelências do estado policialesco se contrai diante do algoz. Por não ser bandido nem estar acuado, tratou Moro e a representante do Ministério Público por querido e querida – seu linguajar popular. Depois disse não sei, não vi, não fui, deve ter sobre o que não tinha obrigação de saber. Afinal, eram ações de terceiros, que a acusação queria contextualizar por conveniência. Alias, contextualizar é prelazia da Farsa Jato, pois Lula e seu defensor não podem contextualizar. “Isso não vem ao caso, a pergunta está indeferida” é o bordão de Moro. A imprensa, suporte principal da acusação é  usada até em sentença, mas não pode ser citada por Lula.
E assim, foi dada sequência a um ritual de desfecho conhecido. Depois de tanto vazar acusações baseadas em ilações não dá pra voltar atrás e basta responder: é minha convicção. Lula pode ser condenado em novo processo. Se é assim, o que tem feito Lula diante do inevitável?
Quero especular sobre isso. Lula sabe que será desgastado até ter sua candidatura inviabilizada. Sabe que uma condenação em segunda instância o tira da disputa. Sabe que só o deixarão concorrer diante da certeza de que o candidato da Farsa Jato será vencedor. Então, Lula sai em caravana se defendendo e defendendo o que fez com provas e convicção. Vai consciente da missão dignificante e pacificadora de levar adiante a bandeira da democracia. Caso concorra e perca, petistas e simpatizantes acolherão com fleugma o resultado das urnas. Mas, se por uma circunstância qualquer concorrer e ganhar, que o seja de forma massacrante, já que a recíproca da fleugma gestora, raivosa ou bolsopata não é verdadeira. E o PT precisa voltar para o povo.

domingo, 17 de setembro de 2017

Julgamento de um episódio infame: os meninos "terroristas", por Luis Nassif

Há pouco mais de um ano, no dia 4 de setembro de 2016, produziu-se em São Paulo um dos episódios mais escabrosos desse período de estado de exceção e perseguição política, que ainda poderá entrar para a história da mesma maneira que as armações do Cabo Anselmo, as Cartas Brandi e outras grandes falsificações da história.
Dilma Rousseff havia caído. Havia movimentações de protesto por várias capitais brasileiras. O componente militar era uma das saídas políticas para coibir as manifestações, conforme imaginado pela quadrilha que se apossou do poder,
Decidiu-se, então por uma armação, de montar uma arapuca, prender um grupo de jovens e imputar a eles propósitos terroristas.
A armação foi montada pelo ex-Secretário de Segurança Alexandre Morais, que se tornara Ministro da Justiça, com a participação do serviço secreto do 2o Exército.
Um militar de 40 anos infiltrou-se em um grupo de namoro de adolescentes. Há suspeitas, inclusive, que tenha se relacionado com menores de idade. Era um desses inúmeros grupos que se organizam virtualmente, através das redes sociais, e que, até então, não tinham combinado nenhum encontro. O primeiro foi marcado para aquele dia, para participar das manifestaçòes.
Seguiram para a Avenida Paulista. Com eles, o capitão do exército William Pina Botelho, agente infiltrado. Foi de Botelho a sugestão para que fossem até o Centro Cultural. Os meninos reagiram um pouco, não vendo lógica na sugestão, mas acabaram acatando. Enquanto caminhavam, helicópteros sobrevoavam o grupo.
Chegando no Centro Cultural, os meninos foram cercados por dezenas de Policiais Militares. Foram levados a um ônibus-viatura, enquanto o capitão escafedia-se. Dentre os objetos encontrados com o grupo, celulares, um chaveiro com a cara do Pateta, vinagre (que serve para contrabalançar gases tóxicos) e algumas máscaras de enfermeira (uma das moças era da Cruz Vermelha). Um dos PMs tentou enfiar em uma sacola um pedaço de pau, que estava no Centro Cultural, mas não teve sucesso: confundiu as sacolas. Arrancaram a insígnia da Cruz Vermelha da moça, para fortalecer a tese do uso de máscaras. Encontraram alguma dificuldade em transformar uma máscara de enfermeira em capuz de black bloc.
Os meninos foram para o DEIC e contaram com o apoio da mídia alternativa, Jornalistas Livres, Mídia Ninja e Ponte. E de dois procuradores da República (federais) ligados a direitos humanos, que correram até lá para impedir qualquer dano físico.
A tentativa de transformar o grupo em terroristas perigosos não resistiu à análise dos rapazes e moças, jovens, estudantes, alguns trabalhando, sem passagens pela polícia. Dentre eles, até uma moça, neta do ex-governador Paulo Egydio Martins que, em sua gestão, lutou contra os abusos do 2o Exército comandado pelo general Ednardo.
Os meninos permaneceram no DEIC até metade do dia seguinte, em clima de absoluto horror. Colocados de costas, os PMs miravam os lasers por sobre sua cabeça, para simular fuzilamento.
Foram liberados por um juíz que protestou contra os abusos das prisões.
Nos meses seguintes, a vida do grupo virou pelo avesso. Alguns foram impedidos de se matricular nas escolas estaduais, muito perderam o emprego, vários se viram tomadas de pânico à menor aproximação da polícia.
Os autores desse feito humilhante, que envergonha qualquer noção de civilidade, foram promovidos. Alexandre de Morais saltou para o Ministério da Justiça de Temer e, depois, para o Supremo Tribunal Federal. O capitão virou major. Os dois procuradores que correram para garantir a segurança dos meninos foram oficialmente admoestados pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), atendendo a uma reclamação do Ministério Público Estadual de São Paulo, por “intromissão”.
Exército e Secretaria de Justiça do Estado atropelaram a Constituição, que diz que a atuação do Exército nos estados depende de acordo formal. Nos meses seguintes, trataram de varrer a sujeira para baixo do tapete.
Nos próximos dias, o grupo será julgado no Fórum da Barra Funda. A juíza será Cecília Pinheiro da Fonseca. O promotor, Fernando Albuquerque, que decidiu denunciar os jovens por terrorismo e formação de quadrilha – o que poderá significar até 9 anos de prisão para os jovens. O nome do agente infiltrado sequer é mencionado, para não caracterizar a ilegalidade da operação.
O resultado desse julgamento será um bom termômetro para avaliar o processo político brasileiro: se refluiu o macarthismo e o Estado de Exceção, e se as vozes da legalidade e do bom senso já se fazem ouvir.
2017-09-16 23:01:57