sexta-feira, 29 de março de 2013

do blog Carta Maior



27/03/2013

Dilma enfrenta a pátria rentista

Uma dia de estupefação e revolta no circuito formado pelos professores banqueiros, os consultores e a mídia que os vocaliza.

Na reunião dos Brics, na África do Sul, nesta 4ª feira, a presidenta Dilma afirmou que não elevará a ração dos juros reivindicada pelos batalhões rentistas, a pretexto de combater a inflação. 

A reação instantânea das sirenes evidencia a cepa de origem a unir o conjunto à afinada ciranda de interesses que arrasta US$ 600 trilhões em derivativos pelo planeta. 

Equivale a dez voltas seguidas no PIB da Terra. 

Trinta e cinco vezes o movimento das bolsas mundiais. 

Os anéis soturnos desse garrote reúnem – e exercem – um poder de extorsão planetária, capaz de paralisar governos e asfixiar nações. 

Gente que prefere blindar automóveis a investir em infraestrutura. O Brasil tem a maior frota de carros blindados do mundo. 

E uns R$ 500 bi estocados em fundos de curto prazo; fora o saldo em paraísos fiscais.

Carros blindados, dinheiro parado, paraísos fiscais e urgências de investimento formam a determinação mais geral da luta política em nosso tempo.

Em Chipre, como lembra o correspondente de Carta Maior em Londres, Marcelo Justo, o capital a juros compunha uma bocarra equivalente a 67 bilhões de euros, uns US$ 90 bilhões de dólares.

Três vezes o PIB. De um país com população menor que a de Campinas. 

A fome pantagruélica desse organismo requeria rações diárias indisponíveis no ambiente retraído da crise mundial. 

A gula que quebrou Chipre é a mesma que já havia quebrado a Espanha, Portugal, Irlanda, Islândia e alquebrado o mercado financeiro dos EUA.

A falência cipriota assusta o mundo do dinheiro não por suas dimensões. 

Mas porque ressoa o uivo cavernoso de uma bancarrota, só anestesiada a um custo insustentável na UTI mundial das finanças desreguladas.

No Brasil o mesmo uivo assume o idioma eleitoral ao gosto do dinheiro graúdo: ‘dá para fazer mais’.

O governo Dilma acha que sim. 

Mas com a expansão do investimento produtivo. Não com arrocho e choque de juros.

O país ampliado por 12 anos de políticas progressistas na esfera da renda e do combate à pobreza, não cabe mais na infraestrutura concebida para 30% de sua gente. 

A desproporção terá que ser ajustada em algum momento. 

Como o foi, com viés progressista e investimento pesado, durante o ciclo Vargas.

Sobretudo no segundo Getúlio, nos anos 50. 

Mas também o foi em 64.

Em versão regressiva feita de arrocho e repressão contra as reformas de base de Jango, no golpe que completa 49 anos neste 31 de março.

O que se assiste hoje guarda uma diferença política importante em relação ao passado.

Nos episódios anteriores, o conflito de classe entre as concepções antagônicas de desenvolvimento seria camuflado pela vulnerabilidade externa da economia.

Um Brasil estrangulado pelo desencontro entre a anemia das exportações e o financiamento das importações colidia precocemente com o seu teto de crescimento.

O gargalo do investimento se realimentava no funil das contas externas. E vice versa.

Era um prato cheio para o monetarismo posar de arauto dos interesses da Nação. E golpeá-la, com as ferramentas recessivas destinadas a congelar o baile.

'Quem está fora não entra; quem está dentro não sai'. 
Durante séculos, essa foi a regra do clube capitalista brasileiro.

Hoje, embora a pauta exportadora se ressinta de temerária concentração em commodities, não vem daí o principal obstáculo ao investimento. 

O país dispõe de reservas recordes (US$ 370 bi). Tem crédito farto no mercado internacional. O relógio econômico intertemporal é favorável ao financiamento de um ciclo pesado de investimentos em infraestrutura.

Quem, afinal, veria risco em financiar a sétima economia do planeta, que, em menos de uma década, estará refinando a pleno vapor as maiores descobertas de petróleo do século 21?

O desencontro entre o Brasil que somos e aquele que podemos ser deslocou-se do gargalo externo, dos anos 50/60/80 para o conflito aberto entre os interesses da maioria da sociedade e os dos detentores do capital a juro.

Assim como em Chipre, na Espanha, nos EUA ou em Paris, o rentismo aqui prefere repousar num colchão de juros reais generosos, blindado por esférico monetarismo ortodoxo. 

Migrar para a esfera do investimento produtivo, sobretudo de longo prazo, como requer o país agora, não integra o seu repertório de escolhas espontâneas.

Cabe ao Estado induzi-lo. 

Dilma começou a fazê-lo cortando as taxas de juros. 

A pátria rentista reclama:no primeiro trimestre deste ano, praticamente todas as aplicações financeiras perderam para a inflação. Ficou difícil multiplicar lucros e bônus sem botar a mão na massa da economia produtiva. 

É essa prerrogativa estéril que os professores banqueiros do PSDB cobram pela boca e pelo teclado do jornalismo econômico, escandalizado com a assertiva defesa do desenvolvimento feita pela presidenta Dilma. 

Presidenciáveis risonhos que se oferecem untados em molhos palatáveis às papilas monetaristas e plutocráticas vão aderir ao jogral. 

“Esse receituário que quer matar o doente em vez de curar a doença está datado; é uma política superada", fuzilou Dilma.

Previsível, o dispositivo midiático tentou desqualificar o revés como se fora uma demonstração de ‘negligência com a inflação’. 

Um governo que trouxe 50 milhões de pessoas para o mercado de consumo minimizaria a vigilância sobre a inflação?

Sacaria contra o futuro do seu maior patrimônio político? 

A sofreguidão conservadora esmurra a própria coerência de sua análise sobre a força eleitoral do governo. 

O governo Dilma optou por abortar as pressões inflacionárias imediatas com desonerações. E enfrentar o desequilíbrio estrutural com um robusto ciclo de investimentos.

Entende que o desafio da produtividade, indispensável à progressão dos ganhos reais de salários, deve ser vencido com infraestrutura e inovação. Não com arrocho, como se fez nos anos tucanos.

São lógicas dissociadas da receita rentista.

Aqui e alhures, a obsessão mórbida pela liquidez descolou-se da esfera patrimonial para a dos rendimentos financeiros. Não importa a que custo social ou político.

Sua característica fundamental é a preferência parasitária pelo acúmulo de direitos sobre a riqueza, sem o ônus do investimento físico na economia.

A maximização de ganhos se faz à base da velocidade e da mobilidade dos capitais, sendo incompatível com o empenho fixo em projetos de longa maturação em ferrovias, hidrelétricas ou portos.

Durante a década de 90, as mesmas vozes que hoje disparam contra o que classificam como ‘intervencionismo da Dilma’, colocaram o Estado brasileiro a serviço dessa engrenagem.

A ração dos juros oferecida no altar da rendição nacional chegou a 45%, em 1999.

Um jornalismo rudimentar no conteúdo, ressalvadas as exceções de praxe, mas prestativo na abordagem, impermeabilizou essa receita de Estado mínimo com uma camada de verniz naval de legitimidade incontrastável.

A supremacia dos acionistas e dos dividendos sobre o investimento –e a sociedade-- tornou-se a regra de ouro do noticiário econômico.

Ainda é.

A crise mundial instaurou a hora da verdade nessa endogamia entre o circuito do dinheiro e o da notícia.

Trata-se de uma crise dos próprios fundamentos daquilo que o conservadorismo entende como sendo ‘os interesses dos mercados’. Que a mídia equipara aos de toda a sociedade.

Dilma, de forma elegante, classificou essa ilação como uma fraude datada e vencida. De um mundo que trincou e aderna, desde setembro de 2008.

A pátria rentista uiva, range e ruge diante de tamanha indiscrição.
Postado por Saul Leblon às 19:17

terça-feira, 26 de março de 2013

Quando a Globo apoia, eu desconfio..................

Publicado em 25/03/2013

Um homem pra chamar de seu


Penso que um dos grandes embrulhos ideológicos do pessoal da direita passa pela sua absoluta convicção de que o individual vale mais do que o social. Essa tese despreza o coletivo como agente, mas adora vê-lo como paciente -  alienado e inerte. A direita cultua personalidades, valorizando os “que se fazem por si mesmos”, os “empreendedores”, os “que fazem diferença”. Ela precisa disso para justificar os bilionários, os especuladores, os banqueiros e todos os que, no mundo do capital, são apresentados como pessoas únicas, diferenciadas, até beneméritas. Afinal, o que seria desse bando de empregados sem essa elite de empregadores?
Na ânsia  de se promover o sucesso  individual a uma categoria paradisíaca, não raro se elevam nulidades à condição de mitos, privilegiando – bem ao gosto dos tempos que correm – narcisismos e egocentrismos,  que fogem do social como o diabo, se existisse, fugiria da cruz...
Acontece  que os ídolos, esses  super-heróis que povoam os noticiários do cotidiano,  podem ter – e não raro têm , porque  sua natureza é humana – momentos  de “pés de barro”. Aí, é preciso um esforço incrível da turma para desconstruir o que construiu, às vezes com sofismas, meias verdades, manipulações e omissões.  Quem conhece bem a história recente da terra do Super-Homem,  do Batman, do Homem-Aranha, do Homem de Ferro, do Indiana Jones, do Rambo, do Rocky e similares sabe das alianças que o império estadunidense manteve , ao sabor de conveniências econômicas, com diversos ditadores que, não mais que de repente, de grandes líderes mitificados  foram transformados em  agentes do mal. Para ficar apenas em dois exemplos marcantes, é só estudar a trajetória de um Saddam Hussein , de um Bin Laden, e suas ligações com os EUA.
Quando estava pensando nesse tema, me veio à lembrança uma canção entoada pela Marina (a cantora, não a Silva) e de autoria do Erasmo Carlos, chamada “Mesmo que seja eu”  ( Veja o vídeo ) O contexto da letra da composição nada tem a ver com meu assunto aqui, mas um dos seus versos (“Um homem pra chamar de seu”) me pareceu um bom título para este artigo. A direita, nacional ou planetária, precisa sempre de um homem – às vezes uma mulher – para chamar de seu (sua). E é tal essa sua “crença”, que mitifica a torto e a direito. A ironia é que faz isso até para denegrir.  Entre nós, ela  quer que se acredite que o Brasil recente só trilhou os caminhos que trilhou porque um homem cheio de defeitos , mas “carismático”, conduziu os brasileiros. Não acredita em forças sociais. Por isso, atribuiu à Dilma (que não tinha “carisma”) a condição de “poste”, e está se dando mal, pois o que o povo valoriza hoje no país, queiram ou não, é muito mais uma política voltada para o combate às injustiças ,  mesmo com  eventuais desacertos, do que esta ou aquela personalidade.  Os índices de popularidade da Presidenta vêm de um continuado trabalho de muitos e que atende a anseios coletivos, mas nunca do exercício solitário de um comando.
A direita repete, agora, esse mantra do “poste” no caso da Venezuela. Convenientemente cega diante dos índices de redução das desigualdades naquele país, atribui o “bolivarismo” ao fato de um “populista demagogo” ter empalmado o poder. Para ela, não há conquistas a garantir, o povo é uma abstração, e como Maduro não é um Chávez, será fácil à turma do capital recuperar o comando. Será? É o que vamos ver. Nada como os fatos para contrariar os desejos...
A “metodologia do endeusamento” adora criar falsos heróis, amplificados pela mídia, para esconder o sistema que os cerca ou que eles representam. É por isso que as eleições na pátria do individualismo, por exemplo, não se definem pelas ideias , mas pelas pessoas. Uma cara simpática, uma família bonita e aparentemente bem constituída, coisas assim elegem  presidentes... E aí está Obama - cheio de aparentes boas intenções, mas imobilizado por forças bem superiores às de um indivíduo - que até agora não foi para frente nem pra trás, muito pelo contrário...   
O caso da eleição do Papa é emblemático. Como não consegue , ou não quer conseguir, enxergar o estrutural, o coletivo, a mídia que representa esse pensamento repercute, amplia e  supervaloriza  os mais simples atos  do novo mito, para muitos um jogo para a plateia alienada,  como ensina a boa e velha demagogia. É como se quisessem impregnar nas mentes a ideia de que, agora sim,  temos (?) Papa... Mas será que um homem (falível ou infalível, não entro nessa) conseguirá, com suas quebras de protocolo, reverter os tortuosos caminhos de uma  Igreja que tem, hoje,  muitos de seus mais altos  representantes envolvidos em diversos pecados capitais?  Implantará a “ficha limpa” no Vaticano?  Estão aí, nesse festival de “malfeitos” que hoje não dá mais para esconder, escândalos de luxúria (pedofilia), ganância (Banco do vaticano), inveja (disputas pelo poder), etc.
A direita assanhada já tenta emplacar o  novo Papa como “um homem pra chamar de seu”. Imagina-o como contraponto ao  que chama de “governos populistas”. Acho que, para variar, está dando um tiro no pé. O ídolo pode ter os pés de barro. Outros, que ocuparam o seu posto, já tiveram...  Muitas mudanças já se fizeram na Igreja...para deixar tudo igual. E aí se desconstruirá mais um mito.  Mas, por outro lado,  pode ser que o simpático Papa resolva efetivamente fazer com que a Igreja se volte para os pobres do mundo. Se isso acontecer, ele não poderá jamais trilhar o mesmo caminho dos adoradores do mercado, dos especuladores, dos exploradores do povo. E a direita terá que buscar, mais uma vez, um representante para chamar de seu...

De boas intenções o inferno está cheio.



segunda-feira, 25 de março de 2013

Os 10 anos da barbárie no Iraque

Fernando Botero/Abu Ghraib
Por Altamiro Borges

A invasão e a barbárie no Iraque completaram 10 anos na semana passada. Os Estados Unidos evitaram festejar a fatídica data. Neste longo período, segundo dados oficiais, mais de 120 mil iraquianos foram assassinados e os EUA gastaram nas operações militares mais do que o PIB brasileiro (cerca de US$ 2,2 trilhões). Outras fontes afirmam que a “guerra” causou mais de meio milhão de mortos e que os tais “prejuízos” foram bem superiores. De qualquer forma, o saldo é extremamente negativo. Um desastre completo!

Segundo recente pesquisa do instituto Gallup, nem os estadunidenses concordam com a ação genocida dos EUA - 53% avaliam que ir à guerra foi um grave erro. Já no Iraque, a situação é de caos e de total falta de perspectiva. Os EUA prometeram paz e democracia, e o resultado foi exatamente o inverso. O país hoje afunda na violência. No mesmo mês em que se “comemorava” a queda de Saddam Hussein, uma onda de atentados vitimou Bagdá com mais de 130 civis assassinados; outros 134 foram feridos.

Uma reportagem do jornal britânico “The Guardian” também trouxe novos elementos que comprovam que os EUA praticaram torturas nos centros de detenção do país. O coronel James Steele, um veterano das intervenções ianques na América Central nos anos de 1980, teria supervisionado diretamente os comandos policiais que instalaram masmorras secretas. Segundo o jornal, as unidades militares dos EUA conduziram alguns dos piores atos de tortura durante a ocupação e aceleraram a entrada do país na atual guerra civil.

Segundo o jornalista estadunidense Seymour Hersh, que revelou torturas em Abu Ghraib, o conflito no Iraque desmoralizou totalmente os EUA. As torturas e humilhações contra os prisioneiros revelaram toda a crueldade do império. Numa série de reportagens publicadas entre abril e maio de 2004 na revista "New Yorker", ele detalhou, inclusive com fotos, as práticas do então presidente George W. Bush. Dez anos após as primeiras bombas caírem sobre Bagdá, Hersh afirma que a invasão do Iraque “não foi apenas errada, mas foi imoral”.

Eleitor de Barack Obama, o jornalista se mostra bem pessimista sobre a política externa dos EUA. “Obama é melhor e mais inteligente do que Bush, mas tudo continua muito difícil”. Ele lembra que muitos iraquianos ainda permanecem presos, em condições desumanas, em Abu Ghraib e em Guantánamo, em Cuba. “A prisão continua em funcionamento. Alguns presos estão em Guantánamo há 11, 12 anos, isso tem um custo. Os americanos estão preocupados? Talvez uma parte muito pequena, mas a grande maioria não se importa”.

Como argumenta o professor de relações internacionais Reginaldo Mattar Nasser, em artigo no sítio Carta Maior, o saldo da invasão do Iraque é um desastre. “O ataque completou dez anos com a constatação por grande parte dos analistas de que a estratégia do governo Bush foi um fracasso: os Estados Unidos e seus aliados não conseguiram alcançar os objetivos anunciados e as consequências da operação militar foram desastrosas, seja do ponto de vista moral, econômico ou militar”.

Mas, para ele, o que o discurso sobre a derrota dos EUA não revela é que a guerra foi e continua sendo uma grande vitória para alguns. “O ataque ao Iraque impactou consideravelmente o comércio mundial de petróleo, pois além de interromper a produção iraquiana, a instabilidade política no Oriente Médio fez com que o preço do produto disparasse. Em 2003, quando os EUA chegaram à região, o preço do barril estava ao redor de US$25. Cinco anos depois, em 2008, ele chegou a US$ 140”. A indústria do setor obteve altos lucros.

Outro setor que auferiu altos lucros foi o da indústria de armamentos. “A percepção de insegurança no mundo proporcionada pela chamada Guerra contra o Terror conduzida pelos EUA, após 2001, propiciou aumento considerável na venda de armas aos países em todo o mundo. As 100 maiores empresas produtoras do mundo venderam US$ 410 bilhões em armas e serviços militares em 2011. Um estudo do Sipri mostra que a despesa militar no mundo, em 2011, foi de 1,6 trilhão de dólares, um aumento de 40% em 10 anos”.

Reginaldo Mattar Nasser também cita a indústria de “reconstrução”, que cuidou da infraestrutura do Iraque devastado, dos serviços de segurança e do treinamento das forças policiais. “A maior parte dos recursos foi alocada na contratação das empresas privadas de segurança. Em 2008, os dez principais fornecedores de serviços militares receberam cerca de US$ 150 bilhões em contratos”. Em síntese: a guerra no Iraque resultou em milhares de mortos e na destruição do país. Mas garantiu lucros recordes aos capitalistas.

“Ou seja, a suposta irracionalidade das ações contraproducentes no terreno militar, durante esses 10 anos no Iraque, é mais aparente do que real e não se trata, como querem ver alguns críticos da ação dos EUA, de uma guerra interminável no sentido de carecer de objetivos claramente definidos ou mal executados. A elite no poder sabe bem o que se espera desse estado de guerra permanente: a expansão dos negócios, domínio de territórios e influencia política”, conclui o professor Reginaldo Mattar Nasser.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Aí tem coisa......


Don Odilo fala em deus e Patrícia responde emocionada: "Que assim seja"
Don Odilo fala em deus e Patrícia responde emocionada: “Que assim seja”

Por Lino Bocchini
A exemplo de quarta-feira, quando foi eleito o novo papa, o Jornal Nacional de ontem também foi quase todo dedicado ao assunto. Com a íntegra em mãos, planejava contar quantas vezes, em 33 minutos de noticiário, determinadas palavras apareceram. Desisti após o primeiro bloco, quando já se somavam 23 “papas”, sete “Jesus Cristo”, seis “missa” e uma pilha de “cardeais”, “igreja”, “basílica”, “deus”, “cúria”, “senhor” etc. Montei então o roteiro de frases abaixo, todas ditas pelos apresentadores William Bonner (nos estúdios da Globo no Rio) e Patrícia Poeta (no Vaticano) e pelos repórteres da emissora que fizeram a cobertura por lá, na Argentina e em Jerusalém. É bom sublinhar que esse texto nem de longe consegue retratar o que foi essa edição do JN de fato. Tudo o que é descrito a seguir vinha acompanhado da entonação certa, trilha “emocionante”, edição cuidadosa, sorrisos etc. As frases estão em ordem de aparição no programa:
“O primeiro dia do novo papa, a primeira missa”
“Como o papa se tornou conhecido pela simplicidade”
“Um papa matutino”
“Começou impondo um estilo novo ao papado e recusou o carro oficial”
“´Também sou um peregrino´, disse”
“Comportou-se como um padre, quase um pai de família. Nem usou o trono para a homília”
“Tem a simplicidade evangélica de João 23 e o sorriso paterno de João Paulo I”
“O papa Francisco começa a conquistar um certo fascínio que já existia entre os cardeais”
“O colégio de cardeais, num grande e inteligente gesto, em poucas horas mudou o rosto da igreja”
 .
Uchôa se questiona: “De onde vem essa inspiração, esse sentimento de humildade?"
Uchôa se questiona: “De onde vem essa inspiração, esse sentimento de humildade?”
Aí entra ao vivo Don Odilo Scherer, que respondeu a 4 perguntas rápidas. Terminou a última, sobre a “torcida brasileira” a seu favor, dizendo que “os cardeais deveriam escolher aquele que deus indicasse”. E Patrícia, emocionada: “Que assim seja”.
Vem então uma reportagem sobre beatificação de João Paulo 2º: “O papa peregrino, João Paulo 2º, pregou com gestos a humildade … tinha sorriso sereno e cativante … enorme carisma para se comunicar com as multidões… a igreja concluiu sua beatificação, último passo antes de torná-lo santo … O clamor começou logo após sua morte, em abril de 2005. Depois, veio a descoberta do primeiro milagre. A cura de uma freira francesa, que sofria de mal de parkinson”. Sim, amigos. O tal milagre entra dessa forma, como uma notícia banal. E, mesmo em um jornalzinho de faculdade parece-me prudente, tratando-se de um “milagre”, usar um “suposto” ou “segundo a igreja”…
Continuam as frases do JN:
.
“O moderado e humilde Jorge Bergoglio”
“Antes mesmo de se tornar papa, já era conhecido por cultivar hábitos simples”
“Nos primeiros gestos, nas primeiras palavras, já um jeito próximo, natural. ´Irmãos, irmãs, boa noite’. Ali estava não mais o Jorge, mas o Francisco”
“O nome já era um recado, mas era necessário mais. E para esse papa, o mais era o menos. Despojado, sem joias, apenas a batina branca”
“Repare no crucifixo, é de aço, nem mesmo é de prata”
[Deixou que] vários cardeais se apertassem no elevador com ele”
“Preferiu ir de ônibus com os cardeais, deixando o carro especial do pontífice seguir vazio”
“De onde vem essa inspiração, esse sentimento de humildade? Até agora, o próprio papa não falou nada sobre isso”
“Francisco parece já ter definido como prioridade do seu papado a solidariedade para os que mais precisam”
“Ontem ao se despedir do público, dizendo ´boa noite, bom repouso´, parecia um pai que vela pelos filhos. Sua santidade. Santa simplicidade” 
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Começa um bloco sobre a vida de Bergoglio na Argentina. O JN lembrou rapidamente das críticas mais fortes que pesam sobre o novo papa, seu alegado apoio à ditadura no país vizinho: “Durante a década de 1970, na ditadura argentina, Bergoglio era a principal autoridade eclesiástica do país. Um jornalista o acusou num livro de ter dado informações que levaram à prisão de 2 padres jesuítas, que supostamente teriam ligações com grupos de esquerda. Em sua defesa, Bergoglio disse que há um documento que prova o contrário. Ele pediu a renovação dos vistos de permanência no país de um deles. Já um biógrafo do papa diz que ele agiu secretamente para ajudar a retirar perseguidos políticos da Argentina”. Esse pedaço “crítico” do noticiário durou pouco mais de um minuto, e termina assim: “Papa Francisco tem posição semelhante a de Bento XVI: é contra o uso de preservativos”.
Voltam as frases:
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“Na terra santa, as pessoas rezaram e se disseram contentes com a escolha de um papa humilde, de nome Francisco”
“Por todo Oriente Médio foi assim: atenções voltadas para o homem de fala suave e olhar sereno”
"Procuramos muito e achamos uma lembrancinha, tá aqui Bonner: ´Habemus Papam Franciscum´"
“Procuramos muito e achamos uma lembrancinha, tá aqui Bonner, to mostrando pra vocês”
“Já que estamos falando de carisma, o que chamou a atenção hoje aqui nas ruas do Vaticano foi o número de fieis tirando fotos, entrando nas lojas e perguntando se tinha um santinho, um terço, uma lembrança do novo papa. Isso horas depois dele ter sido eleito. E quem procurou muito, acabou encontrando. Eu achei, nós procuramos bastante e achamos, tá aqui: “Habemus Papam Franciscum [e mostra um santinho com a cara do argentino]. Tá aqui Bonner, tô mostrando pra vocês”
No bloco final, Patrícia ameaça com um pouco de jornalismo: “Apesar de tanto segredo, a imprensa daqui começa a publicar alguns detalhes do conclave que elegeu o novo papa. De acordo com o que um respeitado vaticanista declarou a um jornal italiano, a primeira votação apresentou o italiano Ângelo Scola, o canadense Mark Ouellet e Jorge Bergoglio com mais votos”. Mas logo desconversa:“Mas isso não importa mais…”.
E segue: 
“Em mais uma demonstração do bom humor que estamos começando a conhecer, o papa brindou com os cardeais que o escolheram” 
Em seguida, recebe os cumprimentos do parceiro de bancada e editor do JN, William Bonner, que encerra assim o Jornal Nacional desse 15 de março:
“Missão cumprida, Patrícia. Para você e para toda nossa equipe que fizeram esse trabalho belíssimo aí no Vaticano, parabéns”.
“Missão cumprida, Patrícia. Parabéns"
“Missão cumprida, Patrícia. Parabéns”

segunda-feira, 18 de março de 2013

Blog da Cidadania


A overdose papal nas mídias e o declínio das religiões no Brasil

Nas últimas semanas, os meios de comunicação do Brasil devem ter produzido um dos maiores volumes do mundo em termos de cobertura da renúncia do líder de uma religião – e é disso que se trata o catolicismo, apenas uma religião – e da escolha de seu sucessor.
No último domingo, vários dias após aquela escolha, o noticiário internacional do jornal Folha de São Paulo, de 17 matérias que publicou, 9 delas foram referentes ao novo líder da Igreja Católica, o Papa “Francisco”.
Claro que boa parte dessa cobertura se deveu a denúncias contra ele feitas na Argentina, no sentido de ter sido cúmplice da ditadura militar que se abateu sobre o país nos anos 1970, mas, ainda assim, o volume do noticiário soou desproporcional.
Além disso, após a eclosão de uma onda de denúncias contra o jesuíta Jorge Bergoglio que começou minutos após o anúncio de seu nome como novo Papa – e que se tem a impressão de que não pôde ser evitada –, sobreveio um noticiário talhado para desmentir as acusações.
Mesmo as denúncias não justificam a overdose midiática papal. Antes de surgirem, houve coberturas intermináveis de cada rito do Vaticano no processo sucessório, com riqueza quase obsessiva de detalhes e em um tom literalmente religioso onde só cabia o tom jornalístico.
A maior franquia da fé do Ocidente teve (na maior parte do tempo) a seu favor uma cobertura das mais generosas que já se viu nas mídias impressas ou eletrônicas. E, supostamente, “de graça”.
É coisa que não se vê em relação a nenhuma outra religião, ao menos no Brasil. Os evangélicos, a segunda religião no país, costumam receber uma cobertura equidistante da mídia, quando não são criminalizados.
Não que certos líderes evangélicos não deem motivos de sobra para, no mínimo, serem criminalizados pelo noticiário. O que não se entende é por que os motivos que os líderes católicos dão para serem igualmente criminalizados são tratados de forma tão diferente.
Ou melhor: entende-se, sim.
Para entender, basta ver o que vem acontecendo com todas as religiões no Brasil. E, para tanto, nada melhor do que os censos do IBGE. Abaixo, portanto, reproduzo gráfico gentilmente enviado pela leitora Marcia Moreira.
Como se vê, enquanto o catolicismo perdeu 27,42% de seus fieis em 30 anos (entre 1980 e 2010), as outras religiões cresceram 198,9%. Todavia, mesmo com o crescimento de outras religiões, isso não compensou o contingente de brasileiros com religião, pois o que cresceu acima de todo o resto foi o contingente de pessoas sem religião, que aumentou 321,05% no período, tendo passado de 1,8% da população para expressivos 8%.
Ao lado do crescimento dos evangélicos, muito provavelmente alavancado pela midiatização da fé, com a aquisição de horários imensos nas televisões e rádios por essas igrejas, é digno de nota o contingente de brasileiros que declaram não seguir nenhuma religião.
Mas antes que se pense em atribuir a queda da religiosidade do brasileiro ao avanço da educação, um dado curioso apurado no Censo 2010: os espíritas formam o grupo que tem maior proporção de pessoas com nível superior completo, chegando a 31,5%, e as menores porcentagens de indivíduos sem instrução – apenas 1,8%.
Os católicos, os sem religião e os evangélicos pentecostais são os grupos com as maiores proporções de pessoas de 15 anos ou mais de idade sem instrução. Ainda assim, o contingente espírita é diminuto. E foi o que menos cresceu em 30 anos – apenas 53,85%.
Quanto ao desastre do catolicismo no Brasil, talvez se possa estabelecer uma relação com a perda de espaço político da direita ao longo das últimas décadas.
E não só no Brasil. Apesar de membros da Igreja Católica terem resistido às ditaduras sul-americanas, como instituição ela foi sustentáculo dos regimes ditatoriais que se espalharam pela região.
Não é por outra razão que o catolicismo é a religião preferida das elites latino-americanas, por sua confiabilidade garantida pelo Vaticano. Os últimos dois Papas tiveram uma intensa atuação política contra a esquerda. João Paulo II foi considerado vital para a derrocada da União Soviética.
Já os líderes evangélicos, esses não servem a elites latino-americanas que tentam por todos os meios impedir o processo irrefreável de redistribuição de renda que vai se espalhando pela América latina. São muito independentes e, ao contrário da Igreja Católica, têm uma relação muito mais direta com os fiéis.
Sobre o expressivo afastamento dos brasileiros das religiões, isso não significa que tenham perdido a fé. Este blogueiro, particularmente, integra esse contingente que mantém a fé em Deus, porém sem querer intermediários.
A percepção de que as religiões todas servem muito mais a interesses políticos e econômicos do que ao propósito que anunciam vai se tornando clara para a sociedade de uma forma que ultrapassa as fronteiras regionais e sociais.
Esse processo de declínio da religiosidade provavelmente é o que mais deverá avançar nos próximos anos.
Com o acesso crescente a novas mídias e, assim, a opiniões outrora sufocadas, as pessoas talvez comecem a entender que Deus não está em templos e que não fala ou negocia por meio desses homens que se autoproclamam intermediários entre nós e Ele.

Carta Maior


Na manhã seguinte ao anúncio de um Papa argentino, o jornal ‘Página 12’ sacudiu Buenos Aires com a manchete: ‘!Dios, Mio!’

Na 6ª feira, dois dias depois, como relata o correspondente de Carta Maior, Eduardo Febbro, direto do Vaticano, o porta-voz da Santa Sé reclamou do que classificaria como ‘acusações caluniosas e difamatórias’ envolvendo o passado do Sumo Pontífice.

Em seguida atribui-as a ‘elementos da esquerda anticlerical’.

Alvo: o ‘Página 12’ .

Com ele, seu diretor, o jornalista Horácio Verbitsky, autor de um livro sobre o as suspeitas que ensombrecem a trajetória do cardeal Jorge Mário Bergoglio, durante a ditadura argentina.

A cúpula da Igreja acerta ao qualificar o ‘Página 12’ como ‘de esquerda’ – algo que ostenta e do qual se orgulha praticando um jornalismo analítico, crítico, ancorado em fatos.

Mas erra esfericamente ao espetá-lo como ‘anticlerical’. 

O destaque que o jornal dispensa ao tema dos direitos humanos não se restringe ao caso Bergoglio.

Fundado ao final da ditadura, em maio de 1987, o ‘Página 12’ é reconhecido como o grande ponto de encontro da luta pelo direito à memória na Argentina.

Não foi algo premeditado.

No crepúsculo da ditadura militar, um grupo de jornalistas de esquerda vislumbrou a oportunidade de criar um veículo enxuto, no máximo 12 páginas (daí o nome), mas dotado de densa capacidade analítica.

E, sobretudo, radicalmente comprometido com a redemocratização e com os seus desafios.

A receita das 12 páginas baseava-se num cálculo curioso.

Era o máximo que se conseguiria produzir com qualidade naquele momento; e o suficiente para a sociedade reaprender a refletir sobre ela mesma.

A fidelidade a essa diretriz (hoje o total de páginas cresceu e a edição digital tem mais de 500 mil acessos/dia) levou-o, naturalmente, a investigar os crimes da ditadura.

Seu jornalismo tornou-se um acelerador da transição que os interesses favorecidos pelo regime militar gostariam de maquiar.

Não apenas interesses econômicos. 

Lá, como cá, existe um núcleo de poderosas empresas de comunicação, alvo agora da ‘Ley de Medios’, no caso da Argentina, que, por interesse financeiro, identidade ideológica ou simples covardia integrou-se ao aparato repressivo. 

Usufruiu e desfruta vantagens dessa intimidade. Até hoje. O quase monopólio das comunicações é uma delas – combatida agora pelo governo de lá.

Naturalmente, a pauta dos direitos humanos dispunha de um espaço acanhado e ambíguo nessa engrenagem.

Não por falta de familiaridade com o assunto.

Mais de uma centena de jornalistas foram presos e muitos desapareceram na ditadura argentina. 

A principal fábrica de papel de imprensa do país foi praticamente expropriada de seus donos.

Eles estavam presos, foram torturados. E então a transferência de propriedade se deu. 

A sociedade compradora tinha como participantes o próprio governo militar e os principais jornais apoiadores do regime. Entre eles o ‘El Clarín’, de oposição frontal ao governo Cristina, atualmente.

O ‘Página 12’ não se deteve diante das conveniências. E vasculhou esses impérios sombrios.

Fez o equivalente em relação aos direitos humanos em outros países. Não raro, com a mesma mordacidade que incomoda agora o Vaticano.

Quando Pinochet morreu em 2006, a manchete indagava: ‘Que terá feito o inferno para merecer isso?’ 

A condenação do ditador Videla à prisão perpétua, em 2010, mereceu letras garrafais: ‘Deus existe!’

Foi com essa ironia, debochada, às vezes, mas sempre intransigente em defesa dos direitos humano, que o ‘Página 12’ tornou-se um espaço apropriado pelos familiares dos desaparecidos políticos.

Por solicitação de Estela Carlotto, atual dirigente das Abuelas de Plaza de Mayo, passou a publicar, desde 1988, pequenas atualizações da trajetória familiar de vítimas da ditadura.

Os anúncios sugerem uma espécie de prosseguimento da vida dos que foram precoce e violentamente apartados dela.

Filhos que perderam os pais ainda crianças, mencionam os netos que esses avós jamais viram; avós falam dos bisnetos.

O efeito é tocante. Ao se deparar com a foto de um jovem desaparecido, sabe-se que hoje ele poderia estar brincando com os netinhos, filhos dos filho que agora tem a idade com a qual ele morreu.

Em 2007, o ‘Página 12’ recebeu na Espanha o prêmio da Liberdade de Imprensa, instituído pela Casa da América, junto com a Chancelaria espanhola e o governo da Catalunha.

Motivo: a seriedade na defesa dos direitos humanos e o compromisso com o rigor da informação, requisito da liberdade de expressão.

No momento em que pairam sombras sobre o Vaticano, o que deve fazer essa cepa de jornalismo? 

O ‘Página 12’ faz o que, em geral, desagrada aos poderes terrenos e celestiais: investiga, pergunta, rememora.

Ao contrário do que sugere o porta-voz da Santa Sé, não se trata de um cacoete anticlerical. 

O assunto extravasa o campo religioso e envolve uma questão de interesse político de toda a sociedade.

Trata-se de uma responsabilidade ecumênica e universal, da qual o ‘Página 12’ não abre mão: o dever de todos, sobretudo das autoridades, de zelar e fazer respeitar os direitos humanos e democráticos dos cidadãos. 

Sob quaisquer circunstancias; mas principalmente quando são ameaçados. Como na ditadura dos anos 70/80. 

Há dúvidas se o passado do cardeal Mario Jorge Bergoglio nesse campo honra o manto santo que agora envolve Francisco, o desenvolto sucessor do atormentado Bento XVI.

As dúvidas estão marmorizadas em um lusco-fusco de pejo, silêncios e versões contrastantes. 

É preciso esclarecer.

Há nomes, testemunhos, relatos, datas e um cenário dantesco: os anos de chumbo vividos pela sociedade argentina, entre 1976 e 1983.

O país do então líder dos jesuítas, Mario Jorge Bergoglio, vivia o inferno na terra, sob a ação genocida de uma ditadura cujos atos confirmam a indiferença aterrorizante dos aparatos clandestinos em relação à vida e à dor.

O que se ouve ainda arrepia.

A mesma sensação inspira o rosto endurecido e gasto dos líderes militares, julgados e condenados. Um a um; em grande parte, graças a pressão inquebrantável das denúncias e investigações ecoadas nas edições do 'Página 12'

Em sete anos, o aparato militar montou e azeitou uma máquina de torturar, matar e eclipsar corpos que operou de forma infatigável.

Nessa moenda 30 mil pessoas foram liquidadas ou desapareceram. 

Mais de 4 mil e duzentos corpos por ano. 

Filhos de militantes de esquerda foram sequestrados, entregues a famílias simpáticas ao regime. 

Muitos permanecem nesse limbo.

No dia em que a ‘fumata bianca’ do Vaticano anunciou o ‘habemus papam’ e em seguida emergiu a figura do cardeal argentino, no balcão do Vaticano, Graciela Yorio esmurrou as paredes de seu apartamento, a 11.200 quilômetros de distancia, em Buenos Aires. 

O relato está nos jornais argentinos e também na Folha de São Paulo.

A revolta deve-se a uma certeza guardada há 36 anos na memória dessa sexagenária.

Em maio de 1976, seu irmão, padre Orlando Yorio, foi delatado à ditadura sedenta e recém-instalada.

Juntamente com o sacerdote Francisco Jalics, este vivo, na Alemanha— Yorio ficou cinco meses nas mãos dos militares.

Incomunicáveis, na temível Escola Mecânica da Marinha, adaptada para ser a máquina de moer ossos do regime.

O delator dos dois religiosos teria sido o cardeal Bergoglio -- o Papa, então com cerca de 40 anos, líder conservador dos jesuítas argentinos.

Essa é a convicção de Graciela, baseada no que ouviu do irmão, falecido em 2000, militante da Teologia da Libertação, como Jalics. 

Jalics não se pronunciou. Alegando viagem, emitiu uma nota na Alemanha em que se diz em paz e reconciliado com Bergoglio.

A nota compassiva não nega a dor que leva Graciela ainda a esmurrar paredes.

A estupefação tampouco é apenas dela.

Ainda que setores progressistas argentinos optem por uma certa moderação em público, muitas vozes não se calam.

Estela Carlotto, a dirigente das Abuelas de Mayo, em entrevista ao ‘Página 12’ deste sábado, procura manter a objetividade num relato que adiciona mais nuvens às sombras.

Carlotto afirma que o Cardeal Bergoglio nunca fez um gesto de solidariedade para ajudar a luta mundialmente reconhecida das mães e avós de desaparecidos políticos argentinos. 

Poderia, mas não facilitou a reunião do grupo com o Papa. Ao contrário.

O primeiro encontro, em 1980, no Brasil, só aconteceu por interferência de religiosos brasileiros. 

As abuelas só seriam recebidas em Roma três anos mais tarde; de novo, graças a contatos alheios ao cardeal Bergoglio.

Prossegue Estela Carlotto.

O cardeal teria sido conivente com o sequestro de pelo menos uma criança nascida na prisão. 

Procurado por familiares da desaparecida política, Elena de la Quadra, teria aconselhado: ‘Não busquem mais por essa criança que está em boas mãos’. 

E desfechou sentença equivalente em relação às demais.

O ‘Jornal Página 12’ tem sido o principal eco desses relatos e dessa revolta, que muitos relativizam e gostariam de esquecer. 

O que o jornal faz ao investigar as dúvidas que pairam sobre Francisco é coerente com o 'manual de redação' sedimentado na prática da democracia argentina nesses 25 anos de existência: não sacrificar a memória ao conforto das conveniências.

Pode soar anticlerical a setores da Igreja que gostariam de esquecer o que já se cometeu neste mundo, em nome de Deus.

Mas é um reducionismo improcedente, que se dissolve na trajetória reconhecidamente qualificada do 'Página 12'.

Na Argentina, graças à persistência de vozes como a de seus jornalistas, a memória deixou de ser o espaço da formalidade.

Hoje ela é vista como um pedaço do futuro. Um mirante poderoso para se entender o presente e superar as forças, e a lógica, que esmagaram a sociedade no passado.

terça-feira, 12 de março de 2013

Hugo Chávez por Paulo Moreira Leite


segunda-feira, 11 de março de 2013

Chávez e a doença de seus inimigos

A morte de Hugo Chávez cumpriu a indispensável função de revelar a imensa dificuldade de seus adversários em fazer uma crítica política a seu governo.
por Paulo Moreira Leite

O esforço para construir um retrato faccioso e negativo de sua passagem pelo governo de um dos países mais pobres do continente, que deixou em situação social muito melhor do que recebeu, explica-se por essa razão.
Apenas cidadãos que sempre dormiram em casas com comida na mesa e roupa lavada podem não perceber a importância de determinadas conquistas obtidas na última década e meia.

Quem lembra que a melhoria básica das condições de existência “não é suficiente” deveria explicar por que, antes, nem o “insuficiente” era possível.

Não custa lembrar a regra de que fome no estômago dos outros é estatística, concorda?

Há muito tempo a oposição interna e externa a Chávez deixara de vir acompanhada de uma alternativa concreta de política econômica e distribuição de renda.

Ele sempre era condenado com definições terminais -- como “populista” e “autoritário” -- sem que elas essas fossem devidamente submetidas a um exame das condições concretas da política venezuelana.

Algo mais profundo sempre me incomodou na postura recente dos adversários de Chávez – uma certa impaciência com o câncer. Sem aquela hipocrisia que os bons costumes ensinam e a boa educação recomenda, nem fingiam torcer por sua recuperação. Numa demonstração mórbida de impotência, a cada viagem a Cuba, a cada nova cirurgia, a cada visita de parentes e amigos, deixavam claro que apenas se perguntavam quando o tumor iria completar um serviço que não eram capazes de realizar pelo instrumentos mais nobre vida pública – o voto.

A desumanização dos adversários é a forma mais selvagem de luta política, nós sabemos. Ela permite o rebaixamento de escrúpulos mais convencionais e dispensa lealdades que se reservam mesmo para os adversários.

Os adversários de Chávez costumam criticá-lo a partir de dois adjetivos. Um deles, “populista”, é um chavão que deveria ser reservado para crianças que ainda não completaram o processo de alfabetização. Como explica o professor Jorge Ferreira, autor de uma biografia indispensável sobre Goulart:

- Populista é o adversário que tem mais voto.

Com isso, Ferreira quer dizer o óbvio: na incapacidade de derrotar um rival, o mais fácil é dizer que não passa de um demagogo. Já vimos este filme tantas vezes, não é mesmo?

Mas o professor argentino Ernesto Laclau, um dos mais importantes intelectuais latino-americanos, tem outra contribuição a este debate. No livro “A Razão Populista”, Laclau rompe com uma tradição de pensamento elitista, que envolveu até diversos intelectuais de esquerda nos anos 60 e 70, que denunciavam Goulart e Getúlio como “aliados da burguesia” para mostrar que aquilo que se costuma chamar de populismo nada mais é do que uma política que procura combinar a defesa dos interesses nacionais com a melhoria das condições de vida do povo.

Concordo com quem observa que Chávez poderia ter avançado mais na reconstrução da economia venezuelana, diminuindo a dependência em relação ao petróleo. Mas a honestidade intelectual obriga a lembrar que isso é muito mais fácil de falar do que fazer. Implica em deixar de elevar os salários e cortar gastos que geram bem-estar imediato da população em nome de investimentos futuros.

Não há almoço grátis em economia. Num país com um dos piores índices de desigualdade da já desigual América do Sul, seria complicado distribuir renda, guardar um bom pedaço do excedente para investimentos – e ainda garantir apoio da maioria da população nas urnas, num governo sob pressão intensa e permanente de adversários internos e externos. É mais fácil, como mostra a experiência de tantos países, arrochar os salários e reprimir o povo. Chávez teve o mérito de experimentar uma opção diversa. Você pode dizer que isso era o melhor para sua sobrevivência política. Concordo.

Mas seus aliados poderiam argumentar que a alternativa era sacrificar a vida do povo – em nome de um futuro melhor que, sabemos muito bem, raras vezes se alcança, não é?

Outra palavra frequente é o “autoritarismo” de Chávez. A repetição desse chavão procura fazer esquecer que Chávez promoveu 15 eleições ou referendos em 14 anos de governo – ganhou 14. Como a maioria dessas disputas foi acompanhada de perto por observadores internacionais, que jamais apontaram para fraudes ou coisa parecida, até por uma questão de humildade seria conveniente admitir que essas vitórias expressavam a vontade do povo – aquele que vota com o estômago, com o cérebro, com o coração, com a vida de todo dia, e não com as estatísticas.

Lembrando que a democracia não é obra do governo, mas envolve o funcionamento do Estado e também a atuação de todas as instituições, inclusive ligadas à oposição, eu gostaria de perguntar como é que se podem definir os adversários de Chávez. Não custa lembrar que em 2002, apenas, Chávez foi vítima de duas tentativas de golpe de Estado, com apoio do empresariado local, da embaixada dos Estados Unidos – e de quem mais você quiser.

Na primeira tentativa, Chávez foi preso por 72 horas, até que uma reação popular garantiu sua volta ao cargo. Na segunda, o país foi colocado à beira do colapso pela alta burocracia da PDVSA, que cortou o abastecimento de todos os combustíveis num país onde o petróleo acende lâmpadas em casa, move a indústria e o comércio, além de fazer andar carros e ônibus. Com apoio internacional, os golpistas conseguiram até impedir que aliados tradicionais de Chávez vendessem petróleo ao país.

Eu me pergunto – eu acho que é um debate real – qual o tipo de tratamento democrático é possível garantir num ambiente golpista, de confronto e ruptura institucional permanente. (Não custa lembrar que, nos anos seguintes, a oposição criou o costume de boicotar eleições, com a única finalidade de produzir impasses e tentar questionar a legitimidade das vitórias inevitáveis de Chávez. De uma forma ou de outra, nunca deixou de investir em rupturas com a ordem democrática.)

A principal reação de Chávez aos golpistas não incluiu prisões em massa nem outras medidas drásticas, tão comuns e muitas vezes justificáveis em horas traumáticas, em qualquer parte do mundo quando se derrota um golpe de Estado. Limitou-se a não renovar a concessão de um canal de televisão, a RCTV, quando ela venceu. Vamos combinar: para quem sofreu dois golpes de Estado num único ano, até que não foi uma opção sangrenta. Os chavistas fizeram tudo dentro da lei para punir uma empresa que havia se valido de uma concessão pública para sabotar a democracia. Não gosto de nenhuma medida que reduz o grau de liberdade num país. Mas na vida concreta, os primeiros a ameaçar os direitos dos golpistas foram eles mesmos, vamos combinar.

Eu estava em Caracas quando a RCTV perdeu a concessão. Não é preciso justificar a medida, mas é bom entender o quadro político. Só havia reação indignada na imprensa internacional. A população reagiu com indiferença, como se quisesse lembrar que nem sempre é fácil defender a liberdade de inimigos da democracia. Estive em comícios em defesa da RCTV. Reuniam funcionários preocupados com o fim de seus empregos e políticos de oposição. Só.

O câncer de Chavez abriu a seus adversários uma oportunidade que eles não foram capazes de conquistar pela luta política. Resta saber como se portarão daqui para frente, diante da provável vitória de Nicolás Maduro nas eleições presidenciais. A grande pergunta é saber se serão capazes de curar-se de falta de apego à democracia.

sábado, 9 de março de 2013

Imprensa mentirosa se desmoraliza/ Eduardo Guimarães


Os noticiários políticos e econômicos dos grandes meios de comunicação brasileiros e os do resto da América Latina deram mais um passo no processo de desmoralização em que mergulharam há cerca de uma década e no qual vão mergulhando cada vez mais fundo.
Logo após o anúncio da morte do ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez, a grande imprensa brasileira foi tomada por um acesso inexplicável de fúria e rancor.
A virulência do noticiário brasileiro se mostrou inexplicavelmente redobrada em relação a alguém que acabara de falecer, o que deveria gerar, se não respeito, ao menos prudente comedimento.
Não foi o que ocorreu. As “análises” dos telejornais – sobretudo os da Globo – sobre a Venezuela pós Chávez retrataram um país mergulhado no caos, na pobreza e na violência.
Imprudente, a dita “imprensa” corporativa pareceu nem suspeitar de que milhões de venezuelanos colocariam suas versões em xeque indo às ruas em comoção pela partida de um líder amado pela esmagadora maioria daquele povo.
Suponho que muitos devem ter presenciado cenas que presenciei nos últimos dias envolvendo pessoas de classe média pouco politizadas e que, como exceção, ainda dão crédito ao que os grandes veículos dizem sobre política, seja sobre a nacional ou a internacional
Muitos estão surpresos com a comoção e o carinho que os venezuelanos estão dedicando a um líder político eternamente acusado pelas mídias brasileira, latina, americana e europeia de tudo de ruim que se possa imaginar.
A pergunta mais recorrente que tem sido vista, é: se Chávez era tão ruim, por que seu povo demonstra tanta dor com a sua partida?
Esse fenômeno não ocorre só no Brasil. Como já foi dito, a grande mídia internacional também sempre vendeu essa história de que Chávez “destruiu” a Venezuela “em 14 anos de governo”, premissa que se choca com o que está sendo visto no país vizinho.
Timidamente, alguns poucos “colunistas” daqui e de toda parte tentam explicar o fenômeno alegando que os povos latinos são ignorantes e, assim, não conseguem avaliar o quanto Chávez era ruim.
Esse, porém, é um discurso perigoso pelo qual só os extremistas midiáticos de direita ousam enveredar. Os mais moderados preferem insinuar.
Apesar de a Venezuela ter produzido os maiores avanços sociais da última década na América Latina, para os “colunistas”, “editorialistas” e até “repórteres” dos grandes veículos de toda parte, isso pouco importa.
Apegam-se aos problemas econômicos que aquele país enfrentou devido à crise econômica internacional, já que depende muito do comércio exterior, ou da exportação de petróleo. E sempre ignorando que os problemas não chegaram ao povo que apoiou Chávez e que hoje chora por ele por ter melhorado drasticamente de vida sob seu governo.
A incompatibilidade sobre o que dizem as grandes mídias e a realidade, porém, não se resume a esse episódio. Aqui no Brasil, a mídia acaba de sofrer nova grave desmoralização por questões econômicas.
Na última quinta-feira, caiu o último de três cavalos-de-batalha midiáticos sobre a economia brasileira lançados entre o fim do ano passado e o começo deste: a produção industrial.
Em janeiro, a indústria brasileira, contrariando todas as previsões midiáticas, cresceu 2,5%. Pouco antes, os alarmismos sobre racionamento de energia e sobre um surto de inflação iminente já tinham caído.
O risco de racionamento que foi vendido como altamente provável, sumiu do noticiário. E a inflação sofreu um tombo sobretudo devido ao barateamento da energia elétrica.
Porém, para usar uma surrada frase de efeito, o fracasso parece que subiu à cabeça da direita midiática. Quanto mais suas previsões furadas se desmoralizam, mais ela reincide nelas.
A crença da direita latina na estupidez popular chega a ser messiânica.
Não é por outra razão que os partidos de direita e os de extrema esquerda que lhes servem de linha auxiliar vão minguando tanto no Brasil quanto no resto de uma América Latina que hoje é a região que mais avança econômica e socialmente em um mundo à beira do abismo.
A direita midiática parece não entender nada. Ao menos é o que dão a entender as suas “análises” desconectadas da realidade.
Incapaz de perceber que, para os povos da região, é assustador que avanços sociais sejam tratados como fatos secundários, subjacentes a critérios sobre as economias que não influem diretamente em suas vidas, a direita chafurda em um discurso catastrofista.
Aqui mesmo no Brasil, o tal de “pibinho” foi alvo de grandes apostas da direita midiática, como se alguns pontos percentuais a menos no Produto Interno Bruto pudessem anular o pleno emprego e o crescimento da renda que se vê nos países governados pela centro-esquerda.
No Brasil, porém, o governo Dilma nada de braçada. Poucos apostam nas chances da oposição no ano que vem, ainda que alguns colunistas se entreguem a devaneios. Já na Venezuela, a oposição direitista trabalha para perder de pouco a eleição do sucessor de Chávez.
Ainda no Brasil, o PSDB e o DEM, os principais partidos de oposição, encolheram assustadoramente no Legislativo, ainda que mantenham alguns governos estaduais importantes. Todavia, no quartel-general tucano, São Paulo, as expectativas não parecem promissoras.
Note-se que o parágrafo acima encontra concordância inclusive entre os analistas da grande mídia mais partidários do PSDB e do DEM. Entre outros jornalistas umbilicalmente ligados ao PSDB, a colunista da Folha de SP Eliane Cantanhêde concorda comigo.
É fácil entender a razão desse processo de desidratação da direita midiática latino-americana. Está sem outro discurso que não seja sobre “corrupção” ou o de negar todos os avanços que a região experimentou na última década.
No Brasil, particularmente, o discurso oposicionista-midiático sobre os avanços do país é ainda mais delirante, pois se alterna entre negar os fatos e, logo em seguida, aceitar os avanços mas atribuí-los ao governo Fernando Henrique Cardoso.
Nesse aspecto, vira e mexe eclode uma campanha midiática tentando “ressuscitar” FHC.
Na eleição para prefeito de São Paulo em 2012, a campanha de José Serra ensaiou pôr o ex-presidente na telinha para “avalizar” o candidato tucano, mas logo que viu o resultado ruim dessa estratégia, abandonou-a.
Até hoje, mais de dez anos após a primeira eleição de Lula, a direita midiática ainda não percebeu que ele só chegou ao poder por conta da revolta dos brasileiros com o estelionato eleitoral praticado por FHC em 1998, estelionato que, inclusive, foi endossado pela mídia.
Apesar de os jovens com vinte anos ou menos não terem memória sobre o governo FHC, pais, avós, amigos, professores etc. lembram muito bem de como era ruim este país até 2002 e sabem muito bem quanto o Brasil avançou na década passada. E transmitem o conhecimento aos jovens.
Não existe hoje na América Latina, portanto, um projeto político viável à direita. E mesmo as aventuras golpistas acalentadas por tantos na região, como as experiências em Honduras e Paraguai, não se mostram promissoras e desestimulam novas aventuras iguais.
Vejamos o caso da Venezuela: a saída de Chávez da cena política não aumentou as chances da oposição. Assim, não adianta extirpar um Chávez ou um Lula, porque a consciência política na América Latina já ganhou dinâmica própria.
Até as apostas em criminalização de líderes de centro-esquerda parecem fadadas ao fracasso.
No Brasil, quem aposta em que a criminalização de Lula irá render dividendos políticos, engana-se. Vista como única chance pela direita midiática para vencer em 2014, será entendida como golpe dos ricos contra os pobres, o que elegerá Dilma ainda mais facilmente.
Em resumo, o que está construindo a hegemonia da centro-esquerda na América Latina é a distância abissal que separa a direita midiática do povo. Essa direita trata a volta por cima no emprego e na renda como fatos secundários.
O maior eleitor da centro-esquerda latino-americana é a direita midiática. Se fosse mais comedida, se respeitasse mas o povão, seria muito mais difícil derrotá-la. A arrogância da elite branca e midiática latino-americana é a sua maior inimiga