quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Comparato em defesa do povo brasileiro

Conversa Afiada publica documento do Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Fábio Konder Comparato para um “Movimento em Defesa do Povo Brasileiro”, que se cria com a colaboração da Deputada Luiza Erundina.

Ela convocou uma reunião na Câmara há duas semanas com trinta deputados, na qual o professor Comparato apresentou as reflexões que se seguem.

EM DEFESA DO POVO BRASILEIRO



Fábio Konder Comparato


A situação de nítida morbidez em que se encontra atualmente o nosso país deve ser analisada segundo os parâmetros estabelecidos por Hipócrates para o tratamento de todas as doenças. Não podemos, com efeito, cuidar simplesmente dos sintomas, sem antes procurar eliminar suas causas, ou seja, a fonte primária da moléstia. 

Empregamos todo tempo a palavra crise para caracterizar o lamentável estado de nossa política e de nossa economia no presente. Ora, justamente, no tratado Dos Ares, das Águas e dos Lugares, o Pai da Medicina denominou krisis, palavra que na língua helênica significa julgamento, o momento preciso em que é possível discernir a doença e desvendar a sorte do doente. É nesse momento que o olhar crítico do médico observa uma mudança súbita no estado do paciente, para o bem ou para o mal; o instante em que se declaram nitidamente os sintomas da moléstia, permitindo o diagnóstico e o prognóstico.

Lamento dizer que, em minha modesta opinião, a crise atual, que não afeta aliás apenas o Brasil, mas o mundo inteiro, aponta, infelizmente para a probabilidade cada vez mais forte de um desfecho sombrio.

Examinemos, pois, antes de mais nada, segundo a lição de Hipócrates, a verdadeira causa da moléstia.

A Oligarquia Brasileira

Uma esquizofrenia política

A nenhum observador atento escapa o fato de que a organização do Estado Brasileiro apresenta um caráter nitidamente esquizofrênico, com a dissociação permanente entre aparência e realidade.

A Constituição Federal em vigor abre-se com a declaração solene de que “a República Federativa do Brasil [...] constitui-se em Estado Democrático de Direito”. Na crua realidade política, porém, nenhum dos três princípios fundamentais aí enunciados vigora na prática.

A Constituição Federal de 1988 declara que constitui objetivo fundamental do Estado Brasileiro “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, com a promoção do bem de todos, sem discriminação de qualquer espécie (art. 3º). Acontece que a realização desse objetivo esbarra no espírito de individualismo privatista, que desde sempre representou um obstáculo insuperável à realização do bem comum do povo brasileiro; ou seja, aquilo que na Roma clássica denominava-se justamente res publica. Não me canso de relembrar a advertência formulada por Frei Vicente do Salvador, em sua obra clássica,2 editada em 1627: “Nem um homem nesta terra é repúblico, nem zela e trata do bem comum, senão do bem particular”.

Nosso país não é tampouco uma Democracia autêntica, porque o povo brasileiro nunca dispôs de poder, não se podendo olvidar que a etimologia grega do vocábulo é exatamente a de poder popular (demos, povo; kratos, poder). 

Desde 1934, vimos declarando, em todas as Constituições, que “todo poder emana do povo” (Constituição Federal de 1988, art. 1º, parágrafo único). Mas a única prerrogativa política efetiva do nosso conjunto de cidadãos é de eleger representantes no Executivo e no Legislativo; sendo que tais eleições (ou escolhas) são feitas, como ninguém ignora, sob forte influência do poder econômico privado e dos políticos profissionais.

Em seu art. 14, a mesma Constituição declara, como formas de exercício da soberania do povo, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Mas no art. 49, inciso XV, ela mesma estabelece que “é da competência exclusiva do Congresso Nacional autorizar referendo e convocar plebiscito”. Ou seja, nessa curiosa forma de mandato político, o povo mandante só tem o direito de se manifestar diretamente, quando seus mandatários lhe derem permissão para tanto… Quanto à iniciativa popular, só admitida em matéria legislativa, e não de emendas constitucionais, ela se tornou impraticável, em razão da exigência absurdamente criada pela Câmara dos Deputados de conferência de todas as assinaturas do 1% do eleitorado, estabelecido na Constituição (um milhão e meio de eleitores atualmente!).

Ainda no campo da Democracia, o Brasil é um dos países em que a Constituição e suas emendas – ápice do ordenamento jurídico – são votadas unicamente pelo órgão legislativo, sem a menor participação do povo.

Finalmente, em matéria de Estado de Direito, ou seja, de controle institucional de poderes em todos os níveis, continuamos deixando muito a desejar. Basta dizer, a esse respeito, que os Ministros do Supremo Tribunal Federal, no exercício de suas elevadas funções, não estão praticamente sujeitos a controle algum, podendo impunemente deixar de cumprir, não só a Constituição (da qual aquela Corte é declarada guardiã precípua pelo seu art. 102) e as leis, como até mesmo as próprias normas do Regimento Interno da Corte, por eles aprovadas. O Supremo Tribunal Federal é o único órgão do Judiciário não sujeito ao controle do Conselho Nacional de Justiça.



Causa da moléstia esquizofrênica

Em toda organização política, os principais fatores estruturantes sempre foram a relação de poder e a mentalidade coletiva, isto é, o conjunto de valores e costumes enraizados no seio do povo. Durante milênios, até o dealbar da idade moderna, ambos esses fatores foram estritamente moldados pela fé religiosa. Com o advento, porém, da sociedade massas, no final do século XIX, iniciou-se uma fase verdadeiramente revolucionária, na qual a mentalidade coletiva passou a ser formada pelo sistema de poder político, de caráter não religioso na maior parte do mundo.    

Ao se consolidar mundialmente a civilização capitalista em fins do século passado, a relação íntima entre esses dois fatores estruturantes da organização política foi radicalmente alterada. Desde então, foi o poder político que passou a plasmar a mentalidade coletiva, utilizando-se, para tanto, do controle dos meios de comunicação de massa, exercido atualmente, na quase totalidade dos países do globo, por oligopólios empresariais.

Pois bem, entre nós, desde os primórdios da colonização portuguesa, o poder político efetivo – diferentemente do poder oficial – tem sido exercido, sem descontinuar, por dois grupos associados: os potentados econômicos privados e os grandes agentes estatais. Nossa oligarquia sempre teve, assim, um caráter binário: quem manda, em última instância, não é apenas a burguesia empresarial, como pretendeu a análise marxista, nem unicamente o estamento burocrático estatal, como sustentaram os seguidores de Max Weber, a exemplo de Raymundo Faoro3. O poder supremo pertence a ambos. É esta, aliás, a principal causa da corrupção endêmica que vigora no Brasil no plano estatal.

Essa oligarquia binária não é, na verdade, uma originalidade brasileira, mas sim um traço essencial do sistema capitalista. Como salientou Fernand Braudel, que lecionou na Universidade de São Paulo logo após a sua fundação, o capitalismo só triunfa quando se une ao Estado, quando é o Estado.4

No curso de nossa História, tivemos uma sucessão de potentados econômicos privados, aliados aos agentes do Estado; a começar pelos senhores de engenho no século XVI, passando pelos traficantes de escravos, os grandes fazendeiros, os industriais, até chegar aos atuais controladores das grandes instituições financeiras.

Verificamos, por aí, como o nosso país sempre acompanhou a evolução do sistema capitalista. Surgimos na História, graças à expansão mundial do capitalismo mercantil europeu, na passagem do século XV ao século XVI. Entramos tardiamente na fase do capitalismo industrial, após a Grande Depressão de 1929. Vemo-nos, hoje, inteiramente mergulhados no capitalismo financeiro, cuja dominação é mundial.

Vale a pena salientar esse ponto, pois ele explica a natureza e as perspectivas de solução da atual crise política e econômica brasileira, como reflexo da crise mundial.

Em obra recente,5 o grande economista francês, François Morin, salientou que, atualmente, um conglomerado de 28 bancos internacionais, detém o controle mundial dos mercados de câmbio, de juros e de capitais; mercados esses de tal forma interligados, que a derrocada de um deles provoca o imediato colapso de todos os outros. Um conglomerado dessa ordem, além de não se submeter a nenhum Estado no plano internacional, exerce uma influência preponderante sobre o poder interno de todos eles.

Ressalte-se que 14 dos bancos integrantes desse oligopólio internacional produzem os chamados “produtos derivados tóxicos”; isto é, os valores mobiliários oriundos da superposição de papéis financeiros de pouco lastro, cuja súbita desvalorização desencadeou, como sabido, a crise de 2008, da qual o mundo ainda não se livrou. O montante atualmente em negociação desses falsos valores mobiliários atinge a soma astronômica de 710 trilhões de dólares, ou seja, o equivalente a dez vezes o Produto Bruto mundial.

No Brasil de hoje, os cinco maiores bancos (Itaú Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Santander) controlam 86% do total dos ativos financeiros; quando em 1995 o montante desses ativos por eles controlados era de 56%. No segundo trimestre de 2015, enquanto o Produto Nacional Bruto entrava em recessão, o lucro líquido contábil dos três maiores bancos privados – Itaú, Bradesco e Santander – crescia 22%.

Desde o término da Segunda Guerra Mundial até o início dos anos 80 do século passado, o Brasil foi um dos países de maior crescimento econômico do mundo. E isto se deveu ao dinamismo industrial, fortemente impulsionado pelo Estado, durante a era Vargas e sob o governo de Juscelino Kubitschek. 

A partir do último quartel do século XX, no entanto, a dominação mundial crescente do capitalismo financeiro, associada à difusão igualmente global do neoliberalismo econômico, que procurou limitar, senão suprimir, toda interferência estatal na economia, provocou uma mudança radical nesse quadro econômico. A indústria brasileira iniciou um processo de debilitação, que persiste até hoje. Para se ter uma ideia aproximada disso, basta dizer que enquanto em 1984 a participação da indústria no PIB de nosso país era de 35,84%, ela é hoje de menos da metade: 13%.

Como sabido, a partir da Revolução Industrial em meados do século XVIII, a riqueza mundial cresceu em ritmo e intensidade jamais vistos na História. Esse crescimento, porém, recuou nitidamente e tende hoje a ser sucedido pela geral estagnação, justamente devido à implantação mundial do capitalismo financeiro. E a razão é óbvia: a essência da atividade industrial é a produção de bens ou a prestação empresarial de serviços, a qual gera o aumento constante da riqueza material. Já a atividade financeira não produz nenhuma riqueza material de base, mas limita-se a criar valores econômicos artificiais, por meio da especulação, ou, na mais favorável das hipóteses, a auxiliar a atividade industrial ou o comércio de bens, pelo serviço de crédito. Ora, exatamente pelo fato de a indústria e o comércio terem se enfraquecido globalmente nas últimas décadas, os bancos – privados ou estatais – passaram a concentrar suas atividades nos negócios puramente especulativos, cujo risco de súbito colapso é enorme.

Como se vê, a celebrada eficiência do sistema capitalista na produção de riqueza vê-se hoje totalmente desmentida. Com isso, a fantástica desigualdade social, por ele criada no mundo inteiro, já não tem a menor condição de ser reduzida, menos ainda eliminada. No início da Revolução Industrial, estimou-se que entre o povo mais rico e o mais pobre do planeta a diferença em termos econômicos era de 2 para 1; atualmente, ela é estimada em 80 para 1! Levando-se em conta o crescimento inexorável da população mundial, não acompanhada de uma correspondente produção de alimentos, não é difícil visualizar o prognóstico sombrio de Malthus, feito no final do século XVIII. E as vítimas serão, como sempre, as camadas mais pobres do mundo todo.

O Brasil, aliás, como ninguém ignora, continua a ser um dos países de maior desigualdade social do mundo, e de maior benefício fiscal para a classe abastada. Segundo dados extraídos da Receita Federal, 30% da riqueza hoje tributada em nosso país estão nas mãos de 0,8% dos contribuintes do imposto de renda. Ora, por efeito da isenção fiscal de pagamento desse imposto ao receberam lucros e dividendos de sociedades, calculou-se em 2013 que quase 200 bilhões de reais foram recebidos pelos contribuintes mais ricos sem pagar um centavo ao Fisco. Em suma, neste país os pobres são muito mais tributados que os ricos.

Ora, para agravar essa situação de escandalosa injustiça, o Estado Brasileiro tem-se revelado radicalmente incapaz de levantar o nível socioeconômico da enorme maioria pobre, mediante adequadas políticas de educação e saúde.

Segundo relatório internacional da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado em maio de 2015, o nosso país ocupa a 60ª posição em matéria de educação, num conjunto de 78 países. O número de nossos analfabetos funcionais é de 27% da população.

Quanto ao nível percentual dos gastos públicos com o serviço fundamental de saúde, em relação ao total da despesa pública, ele é o mais baixo da América Latina: 6,93%, contra 31,76% na Argentina. Pois bem, para cúmulo do absurdo, o governo federal no final do primeiro semestre de 2015, operou cortes de um bilhão de reais no orçamento da educação e mais de um bilhão no orçamento da saúde.

Ora, essa situação de profunda e permanente desigualdade social representa um grave obstáculo à instauração de uma verdadeira democracia em nosso país. É que no regime democrático, diversamente das autocracias ou oligarquias, o poder político não é concentrado, mas difuso por todo o povo. A democracia, por conseguinte, para poder funcionar, pressupõe um nível mínimo de igualdade socioeconômica entre os cidadãos, sem a qual não se estabelece uma comunhão de propósitos e atitudes no seio do povo, ou seja, uma mentalidade coletiva coerente. Foi por isso, como assinalou Aristóteles, que o regime democrático funda-se na existência de uma robusta classe média.

No Brasil, além da tradicional debilidade dessa classe, a mentalidade social foi profundamente marcada por quase quatro séculos de escravidão legal, gerando a difusa convicção de que, ao contrário do que proclama a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, os seres humanos são naturalmente desiguais, em dignidade e direitos.

Com a análise deste triste quadro, não podemos deixar de concluir que o regime oligárquico, desde sempre em vigor entre nós, revela-se totalmente incapaz de enfrentar o grave estado mórbido que tomou conta do país.


Como Evitar a Letalidade da Moléstia?

Comecemos por reconhecer o fato de que a solução revolucionária, entendida como a mudança súbita e radical do poder na sociedade, modelo ao mesmo tempo tão louvado e temido no mundo todo até há pouco, já não convence ninguém. É que esse tipo de ruptura brusca da ordem social só atinge a relação de poder, deixando de lado o outro fator estruturante das sociedades: a mentalidade coletiva. Foi o que se viu, de maneira dramática, com as revoluções bolchevique e maoísta, as quais deram origem aos regimes comunistas na Rússia e na China no século XX. Com a derrocada de ambos no último quartel do século, voltaram à tona, nos dois países, as velhas tradições culturais, doravante ligadas aos valores próprios do sistema capitalista, contra o qual foram feitas as revoluções.

Se quisermos, pois, mudar, de modo substancial e permanente, as instituições políticas, precisamos atuar no sentido de uma reeducação da mentalidade coletiva, com base em novos valores que a se adequem àquelas instituições. E tais valores são o oposto do individualismo privatista, próprio do sistema capitalista.

Ora, isto não se faz e nunca se fez da noite para o dia. Em geral, tem-se em matéria de revoluções, o modelo clássico, que é o da França no século XVIII. Mas o que se deixa na sombra, ao assim considerar, é o fato de que a preparação da Revolução Francesa principiou pelo menos dois séculos antes, com a mudança na visão de mundo, provocada pela Reforma Calvinista e a chamada Revolução Científica de Copérnico, Tycho Brahe e Kepler, seguidos por Galileu e Isaac Newton.
Por outro lado, importa não perder de vista que nada se resolverá, simplesmente atuando no nível político superficial, pela troca de governo ou a modificação de pontos particulares do sistema eleitoral, por exemplo.

O fundamental é iniciar, desde logo, o longo processo de mudança política no nível mais profundo; isto é, no que diz respeito aos detentores efetivos do poder supremo e ao caráter da mentalidade coletiva dominante. Sem essas mudanças de base, jamais estaremos em condições de fazer vigorar entre nós os princípios políticos fundamentais da República, da Democracia e do Estado de Direito.

Mas qual a melhor estratégia para tanto?
Creio que ela consiste em principiar pela criação de um grupo coeso e dinâmico, composto de um lado por agentes políticos e de outro por atores da sociedade civil, dispostos a dar início a esse processo de mudança. 

Quanto aos agentes políticos, penso sobretudo na formação de um núcleo suprapartidário de parlamentares federais, pois as grandes reformas institucionais hão de ser feitas no nível constitucional e legislativo.

No campo da sociedade civil, parece-me indispensável, por tudo o que ficou dito acima, obter o apoio da classe industrial brasileira, particularmente prejudicada pela atual supremacia incontrastável do capital financeiro. O revigoramento da indústria nacional dará, incontestavelmente, novo alento à nossa economia e poderá iniciar a retomada do processo de crescimento econômico. Poder-se-ia começar, por exemplo, nesse setor, pela proposta legislativa de conteúdo local mínimo para todo o setor industrial instalado em nosso país.

Ainda no campo da sociedade civil, é indispensável que o núcleo de parlamentares federais, acima referido, tenha o apoio constante e criativo de especialistas nas principais áreas: direito, economia, finanças públicas, educação, saúde etc.

As propostas pontuais de mudança deveriam, a meu ver, visar à abertura de fendas na muralha oligárquica, tanto no nível da relação de poder, quanto no da mentalidade coletiva. 

Poder-se-ia, assim, pensar prioritariamente em projetos de lei – ou, se possível, em emendas constitucionais –, tendo por objetivo criar instrumentos de democracia direta ou participativa.

Ainda prioritariamente, deve-se iniciar a correção da profunda desigualdade tributária vigorante entre nós, principiando, por exemplo, pelo imposto sobre grandes fortunas, instituído pela Constituição e que aguarda regulação legal desde 1988. Na mesma linha de combate à desigualdade social, é de primordial importância preservar as políticas de educação e saúde de cortes orçamentários, em todas as unidades da federação.

Já no que diz respeito à formação cívica da mentalidade coletiva, cuidado especial deve ser dirigido ao setor de comunicação social, notadamente ao rádio e à televisão. No Brasil, como apontado até mesmo pela UNESCO em relatório de 2010, o setor acha-se submetido há dezenas de anos ao controle oligopolístico de empresas privadas e políticos profissionais, de acordo com o nosso tradicional modelo de oligarquia binária.

Em razão disso, desde a promulgação da Carta Constitucional em vigor, ou seja, há mais de um quarto de século, normas fundamentais que regem a matéria aguardam regulamentação legal para serem aplicadas. Assim é com a proibição do monopólio e do oligopólio, direto ou indireto de todos os meios de comunicação social (art. 220, § 5º). Assim é, da mesma forma, com a norma de preferência, na produção e programação das emissoras de rádio e televisão, a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas (art. 221, inciso I). Em 2011, um partido político e uma confederação nacional de trabalhadores ingressaram, a esse respeito, com ações de inconstitucionalidade por omissão perante o Supremo Tribunal Federal. Acontece que, encerrada a instrução desses processos e já com parecer parcialmente favorável da Procuradoria-Geral da República, os autos permanecem conclusos com a Ministra Relatora desde maio de 2012, numa clara ilustração da vacuidade, entre nós, do princípio do Estado de Direito.

Estas são as ideias e as propostas que me parece urgente e indispensável examinar, neste momento de grande perigo para o futuro do Povo Brasileiro e do nosso País.

12 de agosto de 2015.

'Nós servimos ao povo: é o único amo a quem devemos respeito'

A filha de Che Guevara aponta que os mais de 11 mil profissionais cubanos que atuam no Brasil simbolizam um modelo de medicina baseado na solidariedade.


Saude-popular.org
A médica cubana Aleida Guevara conhece bem os embates, nos âmbitos econômico e político, para se garantir o direito à saúde aos cubanos. Para ela, não foi novidade ver a reação negativa das entidades médicas à chegada de profissionais cubanos para participar do Programa Mais Médicos para o Brasil. “Os conselhos de medicina da América Latina, de maneira geral, reagem de maneira muito desagradável e nos fazem pensar que não são verdadeiros profissionais de saúde, mas mercenários da saúde”, declarou em entrevista ao Saúde Popular, em Havana, capital cubana.
 
A filha do guerrilheiro revolucionário Ernesto Che Guevara aponta que, além de prover assistência médica, os mais de 11 mil profissionais da ilha caribenha que atuam no Brasil simbolizam um modelo de medicina baseado na prevenção e na solidariedade. “Você pode ser útil em qualquer lugar do planeta. Isso é o que aprendemos e tratamos de levar à prática”, apontou.
 
Nesta entrevista, dividida por tópicos, Aleida fala sobre as especificidades do modelo de medicina de Cuba e explica como a saúde se tornou prioridade para o Estado cubano a partir da revolução.
 
 

 
Saúde é viver com dignidade
 
Em 1953, quando do assalto ao Quartel Moncada, Fidel [Castro] foi preso e, como era advogado, fez sua própria defesa, na qual ele falou dos problemas de Cuba e dos projetos que eles queriam fazer se tomassem o poder, e um dos projetos mais importantes era dar saúde ao povo. Aqui, como em grande parte da América Latina naquela época, e infelizmente em outros países ainda hoje, era comum a morte de um ser humano por doenças que podem ser curáveis, pois o médico ficava muito distante do lugar em que vivem [essas pessoas]. Crianças podem morrer por uma simples diarreia, por uma desidratação. Essas eram coisas que existiam em Cuba.
 
Com o triunfo da revolução, Fidel Castro torna realidade o projeto que defende em a “História me absolverá”. Ele escreve tudo que se deveria fazer no processo revolucionário em Cuba e o primeiro é dar saúde ao povo. Se você quer um povo que tenha possibilidade de trabalhar, criar, resistir a situações difíceis, tem que ser um povo forte, saudável.
 
Meu pai [Che Guevara] dizia que o médico devia fazer isso possível. Não só por uma ação como médico, mas por uma ação da coletividade. Meu pai falava da medicina na comunidade, que deve criar um estado de saúde para os indivíduos. Não é somente não ter uma lesão física, uma doença, mas saúde como um conceito mais amplo. Uma saúde no sentido de que se tenha dignidade, trabalho, moradia, que se possa ter um lugar para desfrutar da vida. Isso é o que dá saúde para o ser humano. É ter a possibilidade de viver com dignidade.
 
Nós [cubanos] nos demos conta que era muito mais fácil prevenir uma doença do que ter que curá-la. A medicina cubana se caracteriza, sobretudo, pela prevenção. Prevenimos doenças, mas, ao mesmo tempo, tem um caráter internacionalista. Ou seja, nós nos formamos no curso de medicina já com a consciência de que se pode ajudar o ser humano em qualquer parte do mundo. Você pode ser útil em qualquer lugar do planeta. Isso é o que aprendemos e tratamos de levar à prática. A medicina cubana tem como características fundamentais a prevenção e o caráter internacionalista.
 
A ajuda ao Brasil
 
A presidenta Dilma [Rousseff] pediu esta ajuda à Organização Mundial da Saúde [OMS]. O Brasil não contacta Cuba diretamente, mas sim a OMS. Há uma necessidade, o Brasil é um país imenso e os médicos infelizmente são uma elite, são formados para ter consultórios. Existem alguns em hospitais públicos e alguns muito bons, mas infelizmente não é a maioria e não é suficiente para atender toda a população. Vocês têm muitos médicos, mas o problema é que muitos deles não querem ficar nos lugares mais difíceis. Diante disso, a presidenta viu a necessidade de pedir ajuda. É somente isso. A OMS decidiu que Cuba era um país que poderia oferecer esta ajuda massivamente. Tem muitos médicos nossos também na Venezuela, cerca de 10 mil, outros 2 mil na Bolívia e assim em outras partes do mundo.
 
Conselhos de medicina e os médicos cubanos
 
No início, foi tremendo para os nossos médicos, porque as reações dos conselhos de medicina da América Latina são brutais, porque são de elite. Pensam que os médicos que vão trabalhar nas zonas mais pobres, nas zonas mais difíceis, podem ‘roubar’ clientes. Nisso é que erram, porque nós não temos clientes, nós atendemos pacientes. O cliente é aquele que paga, o paciente é aquele devemos atender, a pessoa que precisa de assistência médica. Nós não perguntamos quanto tem de dinheiro, isso não nos interessa. O que nos interessa é servir ao ser humano. Essa é a diferença entre muitos médicos no Brasil e os médicos cubanos. Nós servimos ao povo e, segundo Che Guevara, é o único amo a quem devemos respeito.
 
Uma parte do dinheiro que OMS paga a Cuba vai para nossos hospitais, para desenvolver mais nossa medicina e, também, para ajudar na vida dos médicos que ficam aqui. Quando se vão esses médicos para outros lugares, os que ficam aqui, às vezes, precisam trabalhar o dobro, porque temos que fazer o trabalho do que se foi. Do ponto de vista econômico, o Estado trata de compensar os que estão trabalhando internamente no país. Normalmente, não temos problema com isso porque temos um povo muito solidário. Quando um cubano começa a dizer que quer mais dinheiro, ou que o exploram, já não é mais cubano. Nós educamos nossa gente, sobretudo, pela solidariedade. Nossos profissionais sabem que muito do dinheiro que ele ganha, neste momento, não vai ao seu bolso, mas vai ao Estado para compensar todas as necessidades que temos em saúde, educação e em bem-estar social do povo.
 
Mercenários da saúde
 
O conselho de médicos [da Argentina] não permite que os cubanos trabalharem em território argentino. A Operação Milagre é uma das ações que a Alba [Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América] desenvolveu com quase 5 milhões de pacientes operados gratuitamente de catarata, para devolver-lhes a visão. Apesar de tudo isso, [o conselho] não quer que médicos cubanos trabalhem lá. Temos que trabalhar pela fronteira da Bolívia por culpa deste conselho de medicina, que não é médico realmente, é um grande reacionário. A medicina não pode buscar benefício para o médico. A medicina tem que buscar benefício para o povo e, neste sentido, os conselhos de médicos da América Latina, de maneira geral, reagem de maneira muito desagradável e nos fazem pensar que não são verdadeiros profissionais de saúde, mas mercenários da saúde.

PAUTA DA VIRADA/Brasil de Fato

15 partidos apresentam documento com propostas para superação da crise


O documento fala em “Pauta da Virada”. As propostas foram consensualizadas pelos líderes do PCdoB, PT, PRB, PP, PR, PROS, PSD, PRP, PRTB, PSDC,  PSL, PMN, PTC, PTdoB e PTN.
26/08/2015
Da Redação

 
Jandira: "Superar pauta conservadora" | Foto: Lucio Bernardo Jr/Câmara 
Representantes de 15 partidos da base aliada do governo Dilma Rousseff na Câmara lançaram, na quarta-feira (26), um conjunto de propostas "para o Brasil retomar o desenvolvimento e superar a crise política". O documento fala em “Pauta da Virada” e dialoga com a Agenda Brasil, conjunto de proposições apresentado pelo Senado ao governo federal na semana passada. As propostas foram consensualizadas pelos líderes do PCdoB, PT, PRB, PP, PR, PROS, PSD, PRP, PRTB, PSDC,  PSL, PMN, PTC, PTdoB e PTN.
A lista de propostas contém 26 medidas divididas em nove eixos temáticos, como políticas monetária, fiscal e tributária e desenvolvimento produtivo e regional (veja a íntegra abaixo). A “Pauta da Virada”, formada por matérias já em tramitação na Câmara e outras a serem apresentadas, será trabalhada junto ao Executivo e às mesas diretoras da Câmara e do Senado. O objetivo do documento é "unificar uma plataforma de ações em prol do desenvolvimento econômico e social do país".
Para o líder do PT, deputado Sibá Machado (PT-AC), o documento é um “ponto de partida” que "se soma a outras iniciativas" com o objetivo de definir os caminhos para o país superar a crise econômica. “Os partidos que subscrevem esse documento também têm muitas propostas para apresentar a esse esforço que está sendo feito para um diálogo nacional, envolvendo todas as forças políticas, os empresários, os trabalhadores e a sociedade em geral, junto com a presidenta Dilma, em favor do crescimento e da superação da crise”, ressaltou o petista.
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), considera que o movimento dos líderes integra um novo ciclo iniciado na semana passada. “O governo recebe essas propostas com absoluta simpatia. Elas expressam a grande política, sugerindo a correção de rumos e alternativas, saindo deste ‘mata-mata’ entre oposição e governo”, avalia Guimarães.
À frente da bancada do PCdoB, a deputada Jandira Feghali (RJ) destaca que a Câmara percebeu a necessidade de se apresentar uma agenda para a sociedade. “Queremos superar uma pauta restritiva e conservadora. As nossas contribuições são bastante abrangentes e expressam um sentimento da base aliada do governo, tratando do desenvolvimento do Brasil, das pessoas e da universalização das políticas públicas”, argumentou Jandira, uma das principais articuladoras da iniciativa que resultou no documento.
Confira a íntegra do documento:

PT na Câmara com PCdoB na Câmara
SUGESTÕES À AGENDA BRASIL
A apresentação de uma Agenda pelo Senado Federal teve um significado importante: colocou em pauta propostas para a economia, deslocando o centro dos debates, que até então pautava apenas o ajuste fiscal e as dificuldades políticas.
Os lideres da base da Câmara dos Deputados resolveram apresentar sua contribuição construindo alternativas ao seu conteúdo e permitindo ampliação do diálogo com as duas Casas, com o governo e a sociedade.
Uma agenda para o país retomar o caminho para o desenvolvimento precisa reafirmar a soberania, a democracia e os pactos federativo e universalista contidos na Constituição, com atenção especial para a redução das desigualdades sociais e regionais, a defesa da cidadania e dos direitos sociais

PAUTA DA VIRADA
Políticas Monetária e Fiscal
1. Adotar medidas para a redução dos juros e de manutenção do câmbio em patamares que assegurem a competitividade da produção nacional.
2. Ampliar recursos para saúde, educação e pesquisa científica, com criação de novas fontes de recursos e garantia de não-contingenciamento do orçamento dessas politicas.
3. Adotar medidas para a realização de receitas não-tributárias, como a securitização da dívida ativa da União, estados e municípios; e a repatriação de ativos financeiros. Em relação a esse último ponto, é importante que a destinação dos recursos priorize gastos em educação.
Desenvolvimento Produtivo
4. Adotar políticas voltadas para o aumento de competitividade, produtividade, com foco na absorção de tecnologia; redução do custo de financiamento; ampliação da exigência de conteúdo nacional e do incentivo à expansão, diversificação, fortalecimento e integração das cadeias produtivas internas.
• Ampliar as políticas de conteúdo local, com maior ênfase no apoio a capacitação dos fornecedores e sua inserção em atividades de maior conteúdo tecnológico;
• Adotar políticas específicas para as cadeias produtivas em formação ou expansão no Brasil, particularmente para os segmentos industriais de defesa, óleo e gás, transportes ferroviários e energias renováveis;
• Reconhecer o SUS como uma importante área de desenvolvimento tecnológico e de formação de uma cadeia produtiva para a indústria nacional de equipamentos médicos e hospitalares e de insumos;
• Ampliar as políticas de apoio à exportação das grandes empresas dos setores de eletrônica e outros de alta tecnologia, bem como a internacionalização das marcas.
5. Apoiar as medidas em defesa da Petrobras e da engenharia nacional.
6. Aprovar medidas para o fortalecimento das micro e pequenas empresas.
Desenvolvimento Regional
7. Aprovar a Política Nacional de Desenvolvimento Regional II.
8. Implementar políticas de desenvolvimento do turismo.
Política Tributária
9. Adotar medidas para ampliar a progressividade da tributação, reduzindo a tributação sobre o consumo e sobre a circulação de bens e serviços e aumentando a tributação progressiva sobre patrimônio: grandes fortunas, heranças, a grande propriedade urbana e rural, o setor financeiro e as remessas de lucros e reservas ao exterior.
10.  Adotar medidas para simplificar obrigações tributárias e facilitar a pronta recuperação dos créditos tributários.
Reforma Política
11.  Adotar medidas para a democratização do processo eleitoral e redução de custos das campanhas.
Pacto Federativo
12.  Aprovar medidas para o aperfeiçoamento e uma repactuação mais justa de receitas, obrigações e responsabilidades do Pacto Federativo.
Combate à Corrupção
13.  Aperfeiçoar a legislação anticorrupção: tipificação de crime de enriquecimento ilícito (PL 5.586, de 2005); e medida cautelar sobre indisponibilidade de bens, direitos e valores (PL 2.902, de 2011).
14.  Mudar a legislação relativa à criminalização da sonegação, tornando-a mais rigorosa e abrangente.
Direito dos Trabalhadores
15.  Adotar medidas para a garantia do emprego, dos direitos dos trabalhadores e do poder aquisitivo dos trabalhadores e aposentados.
Direitos Civis
16.  Adotar medidas que combatam a violência contra a mulher, a intolerância, o preconceito e que assegurem a liberdade religiosa.
17.  Garantir o direito de resposta e o aperfeiçoamento da legislação sobre meios de comunicação com medidas efetivas contra concentração econômica (monopólio e o oligopólio).
18.  Ampliar o orçamento da cultura. Garantir a diversidade cultural regional e a produção local.
19.  Adotar medidas para a política de ressocialização do sistema penitenciário.
20.  Aprovar medidas para o acesso universal às redes de comunicação de dados a baixo custo pra o usuário.
Setor Público
21.  Apoiar os projetos relacionados à desburocratização e à simplificação da relação do Estado com o cidadão e o setor produtivo.
22.  Aprovar mudanças na legislação de licitações e contratos para aperfeiçoamento das regras e dos instrumentos de controle, transparência e eficiência.
23.  Defender a construção, por parte do poder executivo, de políticas para as carreiras e remuneração dos servidores públicos.
Questões Urbanas e Reforma Agrária
24.  Adotar medidas efetivas que assegurem políticas e recursos para melhoria da mobilidade, construção de moradias, saneamento básico.
25.  Aprovar medidas para a modernização e adequação do Código Brasileiro de Trânsito.
26.  Garantir orçamento para Reforma Agrária. Assegurar condições para assentar todos os acampados, como também viabilizar condições de produção e de acesso aos serviços públicos.
Assinam os líderes dos seguintes partidos
PCdoB
PT
PRB
PP
PR
PROS
PSD
PRP
PRTB
PSDC
PSL
PMN
PTC
PTdoB
PTN

Um projeto antinacional e entreguista.