quarta-feira, 31 de outubro de 2012

A suposta agressão quando da votação de Genoino

Verdades sobre a “confusão” na votação de Genoino



Como umas das cerca de 100 pessoas que estavam na porta da Universidade São Judas, em São Paulo, na tarde de domingo, dia 28 – portanto, testemunhas do que a imprensa está chamando de “agressão a jornalistas” durante o voto do ex-deputado federal José Genoino –, não podemos nos omitir diante da prevalência da versão mentirosa que tem circulado como real.

Não é verdade que militantes petistas discutiam com militantes do PSDB na porta da universidade. Não havia militantes do PSDB na porta, mas apenas um casal identificado com adesivo do PSDB, acompanhado de uma criança, que passou todo o tempo ao lado do Vesgo, do programa Pânico, provocando os petistas. O humorista entregava ao casal cartazes alusivos ao “mensalão” para que fossem fotografados com ele. Assim, havia forte suspeita de todos os que acompanhavam o movimento que o casal havia sido contratado para provocar. Tanto que, com exceção dele, nenhuma outra pessoa foi hostil ao grupo de mulheres do PT que lá estava e que, de fato, pelas tantas, passou a trocar ofensas e xingamentos com o casal – único momento em que a polícia foi chamada para intervir. A suspeita de que o casal estava lá para provocar ficou mais evidente quando, com a chegada de mais petistas, ele decidiu ir embora, ela justificando: “Ah, vamos embora que o homem não vai vir votar não”. Foram sob os gritos de “contratada, contratada” e reagiram rindo.

Não é verdade que, ao sair do carro, o ex-deputado José Genoino recebeu do grupo de apoiadores uma bandeira do Brasil para cobrir o rosto e não ser fotografado, como escreveu o jornal O Globo, em matéria assinada por uma jornalista não esteve no local. A bandeira foi ofertada a ele para que se enrolasse nela. Não fosse assim, não teriam sido publicadas tantas fotos dele, sempre de rosto descoberto.

Não é verdade que houve vandalismo. Antes de o ex-deputado José Genoino chegar para votar, um representante dos apoiadores dele conversou com representante da diretoria da universidade e questionou se ela desejava que a polícia fizesse uma espécie de corredor para garantir mais segurança. Ela recusou, afirmando que “Genoino era um eleitor como outro qualquer”.

Não e verdade que uma senhora que chegou para votar foi derrubada por militantes petistas, também como afirmou a imprensa. A senhora chegou (não à toa vestida de vermelho) para “apoiar e dar um abraço no Genoino”. Ela havia participado, duas semanas antes, da reunião dos amigos de 68, em que estiveram, entre outros, Genoino e Jose Dirceu. Ela caminha com o auxílio de uma bengala e, na entrada tumultuada dos militantes, caiu e foi socorrida imediatamente por vários deles. Alguns cinegrafistas se aproximaram e uma suposta jornalista perguntou a ela quem a havia empurrado: “Foram os fotógrafos, que passaram correndo”, afirmou. Mas isso não saiu em nenhum jornal! Além dessa senhora, uma jovem foi derrubada também pelos fotógrafos, e um cinegrafista, que estava no meio do tumulto, caiu. Nenhuma pessoa que entrou para votar sofreu qualquer lesão.

Não é verdade que houve “pancadaria”. Houve, sim, o empurra-empurra típico das aglomerações, e a até agora alegação de agressão de um dos humoristas do programa CQC, que fez todo tipo de provocação e se postou (ele mesmo admite) diante do veículo onde supunha que Genoino estivesse (ele já havia ido embora àquela altura). No calor do conflito, com os ânimos acirrados, a insistência do humorista em falar com o ex-deputado teria irritado alguns militantes, o que, se ficar provado, terá sido o único incidente da manifestação.



Assinam:


Austriquiliano Lucena

Daniela Antunes

Danylo Bomtempo

Natalina Ribeiro

Marcia Barral

Sergio de Carvalho

terça-feira, 30 de outubro de 2012

do Blog Chuta que é Macumba

15 outubro 2012


Quem é de luta



Sou meio metido ao engajamento em lutas alheias mais do que em minhas próprias, talvez por ser intrometido ou por ter comigo que valorizar os outros é uma forma de valorizar a mim. Independentemente de explicação, sempre lembro dos professores com algum carinho - uns mais, outros menos - e também com amor depois que a melhor prô desse mundo, a Evinha, entrou na minha vida.

Indigna-me em doses cavalares ficar sabendo de cada ingerência do poder público sobre a vida dela. São de matar o despreparo e o desprezo que governos estadual e municipal dedicam aos professores, que acabam sendo forçados a fingir adequação ao burocratismo e mercantilismo que tomou conta de toda a Educação básica. Assim sendo, impossível eu não tomar partido numa briga tão essencial.

Imaginem os senhores fazendo uma jornada diária de 12 horas e, na maioria das vezes, lidando com problemas que não são seus - há quem acredite que levar o filho na escola é o único dever da paternidade - para depois receber um contracheque vergonhoso, ver seu direito de greve podado pela PM, sindicatos e até mesmo pela opinião pública. E, ainda assim, não esmorecer e cumprir com seu dever de maneira digna e responsável? Coisa para poucos, meus caros...

Um viva a todos os profissionais da Educação desse país que passam por esses perrengues e não perdem a esperança. Isso é que são guerreiros! PARABÉNS, PROFESSORES!




Midia acha que eleitor é retardado/Blog do Miro

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:


Por entender que a aliança entre o PSDB e a grande mídia é danosa ao país, talvez não devesse escrever este texto. Afinal, aqui será explicado por que essa aliança vem colhendo fracassos eleitorais cada vez mais retumbantes e essa explicação poderia salvar esse grupo político do haraquiri continuado que pratica cotidianamente.


Todavia, conto com a proverbial arrogância dessa gente para impedi-la de sequer refletir sobre o que direi. Afinal, foi só dizer que José Serra não deveria usar o “kit-gay” que ele mergulhou de cabeça em uma das “estratégias” políticas mais desastradas de que se tem notícia, a qual só perde para a bolinha de papel de 2010.

Vamos ao trabalho, pois. Ao fim da tarde de domingo, certo sadismo me fez sintonizar a televisão na Globo News e/ou na Band, de forma a assistir as coberturas que as emissoras faziam da reta final da eleição em São Paulo. Dirão, assim, que não sou sádico, mas masoquista.

Enganam-se. Cometi esse ato para ver as caras dos pistoleiros do PIG diante do fato de que Fernando Haddad dera uma sova eleitoral em José Serra. E não me decepcionei. Estavam mais do que abatidos, estavam desorientados. Sobretudo na Globo News. Literalmente não sabiam o que dizer, por mais que tentassem afetar naturalidade.

A cena de desorientação e abatimento daqueles jornalistas era tão ridícula que comecei a pôr mensagens no Facebook e no Twitter convocando pessoas a assistirem àquele espetáculo patético. Não tardou e as redes se incendiaram e posts sobre a Globo News começaram a aparecer na blogosfera.

Sobretudo porque a emissora levou para a bancada que pretendia analisar os resultados das eleições o indefectível Merval Pereira, Renata Lo Prete (Folha de São Paulo), Cristiana Lobo e Gerson Camarotti (Globo News).

Lobo era a mais desorientada, ainda que não fosse a única. Chegou a dizer que Lula conseguiu eleger Haddad “por sorte”. Mas o ponto alto foi quando todos eles concordaram que o mensalão tinha, sim, afetado a imagem do PT. Eis que um deles – não me lembro qual –, em um lampejo de lucidez, lembra que “não afetou eleitoralmente, mas afetou”.

Eu ria e falava sozinho. Perguntei à televisão: “Mas se o mensalão não afetou eleitoralmente o PT, afetou como? Entre quem? Em Higienópolis? Entre quem odeia o PT?”.

É piada, não?

O fato é que, como Cristiana Lobo estivesse catatônica, dizendo coisas cada vez mais sem sentido – tão sem sentido que Merval, justo ele, lançava-lhe olhares de incredulidade – e aquilo já me provocava vergonha alheia, decidi espiar a Band. Aí é que a coisa ficou mesmo divertida.

Quem falava era o senador paranaense Álvaro Dias. Se eu contar o que ele disse, se você não assistiu ao programa não irá acreditar. Para ele, o povo fez do PT o partido mais votado em 2012 porque “não ligou o nome à pessoa”. Ou seja: o povo votou no PT em todo país sem saber que estava votando no PT (?!).

Você não acredita? Então assista, abaixo, a declaração do tucano – e não se preocupe que o vídeo só tem pouco mais de um minuto. Continuo em seguida.

Se você pensa que foi só, enganou-se. O que veio em seguida foi ainda pior. Um dos jornalistas da Band disse, como se estivesse falando do clima, que o mensalão não foi suficientemente explorado…

Não é difícil entender, portanto, a razão pela qual o PT, sob esse bombardeio midiático e partidário incessante do julgamento do mensalão, disparou na preferência popular.

Quem pode ser tão retardado a ponto de assistir a 20 minutos ininterruptos de Jornal Nacional apresentando os “melhores momentos do julgamento do mensalão” sem perceber que aquilo visava a eleição que ocorreria menos de uma semana depois?

Quem pode ser tão desmemoriado a ponto de não se lembrar mais, após tão pouco tempo, das previsões de que Lula havia chegado ao seu ocaso e de que Haddad não tinha chance?

Quem pode ser tão cretino a ponto de achar normal que o procurador-geral da República, um ministro do Supremo e uma horda de jornalistas de Globo, Folha, Veja e Estadão torçam todos, juntinhos, para que um julgamento interfira em eleições?

Não resta dúvida de que julgam que este é um país de retardados independentemente de classe social e grau de instrução. Dessa maneira, insultam o brasileiro eleição após eleição. Dizem uma coisa aqui, eles mesmos – ou os fatos – desdizem logo ali e acham que ninguém nota. Por isso é que ninguém mais lhes dá bola

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

SAUL LEBLON em Carta Maior

28/10/2012

O que fazer com a vitória em SP?




Nem o gigantismo da cidade, nem o valor do 3º orçamento do país, depois do brasileiro e o do Estado de SP - ainda que isso tenha um peso objetivo óbvio - elucidam porque o pleito de São Paulo se transformou no principal foco de atenção da mídia e do interesse nacional.

O que distinguia o embate aqui como a disputa-chave da política brasileira em 2012 era o confronto direto entre duas concepções de país, duas visões de democracia e duas propostas de desenvolvimento.

Pode-se dizer, em adendo, que um julgamento de recorte nitidamente conservador desse antagonismo --quase um horário eleitoral paralelo-- está sendo levado a cabo no STF há mais de 70 dias.

No das urnas, venceu a agenda personificada por Fernando Haddad, com a desassombrada estratégia política de Lula.

O que foi derrotado não é pouco.

Já em 2002, ao perceber como inexorável a vitória do PT, o tucano José Serra fez uma opção endossada pelos barões da mídia, embarcados no mesmo destino.O tucano queria reunir uma bolsa de pelo menos 35 milhões de votos no segundo turno para se tornar o líder do anti-petismo no país.

Consolidar-se como a nova garganta conservadora, na linhagem de um Carlos Lacerda & assemelhados, implicava eliminar concorrentes dentro e fora do PSDB; catalisar com a facilidade previsível um leque de interesses do mercado e, sobretudo, coordenar a crosta de jornalistas e editores alinhados ao objetivo de impedir que Lula e o PT consolidassem uma nova hegemonia progressista na sociedade brasileira.

Serra teve pouco mais que 33 milhões de votos em 2002, contra quase 53 milhões de Lula, o segundo presidente mais votado do mundo, depois de Reagan.

Sofreria um segundo revés para a estreante Dilma Rousseff, em 2010, que trincou compartimentos do amplo comboio coservador que comandava. Pode-se perguntar, com razão, o que seria o futuro de Serra se não dispusesse da ancora midiática que o sustentou até agora.

Em que pesem os descarrilamentos e colisões, o tucano manteve intacto esse vagão cargueiro estratégico, de olho numa aposta ainda mais ousada.

No curral de escribas e editores aliados estava a arma decisiva para o tudo ou nada que se urdia mais adiante: fazer do julgamento do chamado ' mensalão' a mãe de todas as eleições; uma espécie de terceiro turno reordenador capaz de condicionar o futuro e reescrever o passado, na determinação de desmoralizar o PT, destruir uma geração de lideranças, inviabilizar Lula e fragilizar Dilma até o limite do constrangimento.Quem sabe, viabilizar assim a nova tentativa do ticano de chegar à Presidência, em 2014.

Serra vislumbrou na desfrutável interseção entre a eleição municipal e o julgamento da Ação 470 o palanque ideal para emergir como a garganta de ouro dessa desforra anti-petista, modulada pelo jogral das togas no STF.

A derrota em SP acontece quando o conservadorismo e o seu curral midiático manejavam o que parecia ser a tempestade perfeita contra a esquerda.

Essa é a natureza do desastre de proporções ferroviárias que Serra e companhia acabam de colher na capital logística, política, financeira e ideológica das forças que o apóiam.

O PT não pode tratar essa vitória com acanhamento.

Ela é mais profunda até do que sugerem os ingredientes visíveis na superfície das urnas.

O moralismo oportunista de Serra, sua mutação de quadro desenvolvimentista ("de boca", diz Conceição Tavares) para um aliciador de malafaias, telhadas & higienistas sociais não acontece por acaso.

Trata-se da exteriorização predatória de um colapso subjacente à campanha na qual muitos viam uma mutação do eleitor em consumidor.

Errado.

A degradação ética e política de Serra reflete, além do caráter, o esgotamento do projeto neoliberal abraçado pela coalizão conservadora no Brasil.

Quem se propunha a resolver os desafios da economia e da sociedade com a desregulação radical dos mercados, associada a um choque de laissez-faire sobre os diretos sociais, perdeu o chão a partir da crise de 2008, a maior do capitalismo desde 29.

Sobrou às gargantas conservadoras contrapor à desordem neoliberal a ordem e o progresso dos savonarolas & malafaias que não alteram a essência da mecânica conflagrada.

Recolocar as forças da economia à favor da sociedade, à favor da cidade e da cidadania implica, em primeiro lugar, politizar uma crise capturada pelo hermetismo das mesmas propostas e protagonistas que a originaram.

Essa é a contrapartida imediata que a cidade de São Paulo espera do PT. Em primeiro lugar, estabelecer laços de participação e discernimento que permitam à população entender a raiz de seus problemas. No limite, decidir em escrutínios plebiscitários o rumo a tomar.

A desordem quase ruinosa do ambiente urbano paulistano guarda vínculos com a desordem decorrente do naufrágio da exacerbação mercadista que jogou o mundo na crise atual.

Estamos falando de um tecido urbano conflagrado por cisões, desigualdade, terceirizações suspeitas, recuo criminoso do Estado, abandono do espaço público, privilégio, precariedade, desperdício de um lado e desencanto de outro.

Não há panaceia técnica , tampouco orçamento suficiente para colar a curto prazo esse vaso de cristal trincado em milhares de pedaços.

Ou se politiza as diretrizes a seguir com a participação da sociedade, ou será a rendição aos ditames dos donos da metrópole.

O PT cometeu um erro em 2003, quando despolitizou em parte e negligenciou em grande medida o debate desassombrado dos desafios herdados do tucanato.

Não pode repetir esse passo agora, assentado nas lições de mais de dez anos no plano federal, ademais de duas gestões em SP.

Fernando Haddad dispõe de um saldo de experiências administrativas de esquerda para que se possa partir aqui de um nível superior de interlocução com a cidadania.

Mais que isso, ao contrários das administrações petistas anteriores na cidade, não assume constragido pelo cerco federal;tampouco tem na Presidência da República uma corrente de transmissão da crise internacional para dentro do país.

Quando assumiu o governo em 2003, o PT , ao contrário, recebeu como herança um fracasso em espiral ascendente. O risco-Brasil estava nas alturas; o dólar perto de R$ 4 reais e a inflação projetada para 12 meses perseguia a fronteira dos 30%.

A urgência da estabilização relegou a reforma política para um segundo momento.

Acuado pelo cerco conservador e perplexo com as mazelas herdadas, o partido durante os primeiros anos de governo sequer discutiu a necessidade de uma mídia independente que facilitasse o diálogo honesto entre as opções limitadas do país e as urgências da sociedade.

Rendeu-se assim à mediação feita pelo dispositivo conservador, que seccionava seu diálogo com a população e pautava diariamente a agenda do governo, ao sabor de interesses que não eram os do país, nem do seu povo.

Em uma palavra, tornou-se quase refém da lógica que havia derrotado no voto.

Uma relação de forças distorcida pela exacerbação midiática, incapaz de dar suporte democrático às mudanças requeridas pela sociedade, manteve-se desse modo como o fiel da balança dos compromissos e programas sancionados pelas urnas.

O antagonismo entre as duas lógicas acentuou-se na permanente negociação da governabilidade que seguiu o padrão histórico: coalizão com divisão de cargos, dentro de um sistema político que irradia suas distorções para as políticas públicas.

A construção das coalizões políticas é indispensável nas democracias representativas. O PT não errou ao ampliá-las. Mas urdi-las sem o debate simultâneo com a sociedade pode amesquinhar o próprio mandato e a força intrínseca que as urnas conferem ao governante.

É querer infantilizar a sociedade brasileira reduzir esse impasse ---e seus desdobramentos-- a um enredo de bandidos e mocinhos; de puros contra pecadores, como pretende certa narrativa preconceituosa e despolitizante que se esponja no teatro das togas da Ação Penal 470.

Por isso tudo, o primeiro passo em São Paulo é arejar o poder da cidade sobre ela mesma; abrir as portas da prefeitura, criar outras novas, eliminar trancas e truques contrparios aos interesses da população, sobretudo a mais pobre, e trazer a cidadania para a discussão serena e responsável da equação que interliga urgências, recursos e solidariedade.

No auge da crise de 2005 , quando a oposição ensaiou um movimento de impeachment contra o Presidente Lula, o escritor Fernando Veríssimo lembrou em uma crônica, o militante anônimo do PT, "....aquele sujeito agitando a bandeira vermelha, sozinho na esquina, porque acreditava, porque confiava'.

A melhor forma de São Paulo trazer de volta esse espírito tão precioso de desprendimento engajado é chamar a populaçao a assumir as rédeas do seu destino. Abrindo discussão imediatamente sobre o futuro da cidade com a cidadania. A ver.

Foto: Marcelo Camargo/ABr
Postado por Saul Leblon às 19:43

domingo, 28 de outubro de 2012

A eleição da Haddad

Publicado em 28/10/2012

Santayana: por que
Haddad deve ganhar

Nas duas vezes em que o Partido dos Trabalhadores administrou a cidade – com Luísa Erundina e com Marta Suplicy – seu desempenho foi excelente.

Saiu na carta Maior:


Por que Haddad será eleito

Tempos novos pedem homens novos. Estas eleições são as primeiras que se disputam sob a vigência da Ficha Limpa. E, ao contrário do que muitos temiam, o julgamento da Ação 470, pelo STF, em nada influiu sobre o comportamento dos eleitores que estão aprendendo, sim, a votar de acordo com os seus interesses e os de suas comunidades.

A menos que haja um terremoto de oito pontos na escala Richter, ou os céus derramem de novo o dilúvio – e desta vez só sobre São Paulo – Fernando Haddad deverá ser eleito hoje prefeito da maior cidade do Hemisfério Sul.

O ex-ministro da Educação não é ainda uma figura carismática da política, mas sendo homem jovem, não lhe foi difícil comunicar-se com a população. Homem de boa formação, soube dialogar com os auditórios de classe média e, não sendo de postura arrogante, tampouco teve dificuldades em conversar com os que sofrem na periferia. Além disso, a candidatura de seu adversário, fora outras dificuldades, arrastava o fardo da administração Kassab. Os paulistanos queriam mudança.

A cidade de São Paulo é, em si mesma, realidade política própria – pela densa população, pela identidade cultural, e pela economia que, há quase cem anos, é a mais importante da federação. Os poderes de fato da grande cidade raciocinam com pragmatismo e, em certo momento da campanha do primeiro turno, perceberam que não deviam ver o candidato do PT como ameaça aos seus interesses. Contra os seus interesses, sim, seria a eventual vitória de Russomano, comparável a uma caixa preta indevassável.

É certo que esses poderes não decidem, por eles mesmos, uma eleição desse porte, mas ao reduzirem seu apoio a Serra – que já iniciara a corrida com os pés amarrados a uma rejeição pesada – favoreceram, de alguma maneira o candidato do PT. Essa postura se deve à circunstância de que, nas duas vezes em que o Partido dos Trabalhadores administrou a cidade – com Luísa Erundina e com Marta Suplicy – seu desempenho foi excelente. Com todos os problemas crônicos da cidade, que se explicam no mau planejamento do passado e a conseqüente expansão urbana desordenada, e a manifestação aguda dessas dificuldades – sobretudo com as enchentes, apagões e violência -, o PT agiu com zelo e prudência quando governou a capital.

Essa prudência e esse zelo contrastam com os últimos oito anos de governo dos tucanos, que transformaram São Paulo em uma cidade inabitável, conforme denunciam os mais conhecidos e respeitáveis intelectuais brasileiros, que redigiram e assinaram o manifesto em favor de Haddad – que pode ser lido nesta Carta Maior. Como se sabe, e o Manifesto destaca, o programa de governo de Haddad nasceu dos encontros com a população e com ela foi discutido exaustivamente. Seu propósito é o de devolver São Paulo ao humanismo e ao sentimento de solidariedade de todos para com todos os seus habitantes.

Esse passado a ser corrigido, somado às condições conjunturais da política, deu impulso à candidatura proposta por Lula. Houve também o convencimento político de Marta e de Erundina, de que não podiam fazer da presença do tempo de televisão de Maluf a razão para entregar a Serra a prefeitura. As duas engoliram em seco o que lhes pareceu demasia, e ajudaram a campanha, exatamente ali onde seus conselhos são mais ouvidos: na periferia.

Tempos novos pedem homens novos. Estas eleições são as primeiras que se disputam sob a vigência da Ficha Limpa. E, ao contrário do que muitos temiam, o julgamento da Ação 470, pelo STF, em nada influiu sobre o comportamento dos eleitores. Em todos os lugares, em que ganhou e perdeu e em que ganhará ou perderá hoje, o PT esteve e está sujeito ao seu desempenho próprio na circunscrição eleitoral em questão. Os eleitores, ao contrário do que, de um lado e do outro, podem pensar candidatos e partidos, está, sim, aprendendo a votar de acordo com os seus interesses e os interesses da comunidade.

Por tudo isso, pela sua gestão como Ministro da Educação, em que atuou decididamente para levar os pobres à Universidade, e mais o prestígio de Lula e Dilma, o que não é pouco, Haddad deve ganhar, e com folga, as eleições de hoje em São Paulo.

do Blog da Cidadânia


São Paulo amadureceu pela dor



São Paulo está dando o primeiro passo para começar a se livrar de uma quadrilha formada por dois partidos que, há uma década, apesar de subsistirem em terras paulistas, o Brasil vem rejeitando progressivamente: o PSDB e o DEM. E por um consórcio de impérios de comunicação que atingiu o porte paquidérmico que tem hoje graças às incontáveis arcas de dinheiro público que recebeu da ditadura militar pelos favores que lhe prestou.
José Serra, o lunático que o povo de São Paulo ora manda para a aposentadoria, tem todas as características de capo: autoritário, impiedoso, preconceituoso, truculento, cínico e, segundo o livro A Privataria Tucana, desonesto – sua filha e outros parentes, enquanto o governo federal do PSDB vendia patrimônio público a preço de banana, recebiam milhões e milhões de dólares de remessas inexplicáveis do exterior.
Mas o que impôs a Serra a derrota acachapante da vez não foram os questionamentos éticos que, por um misto de cumplicidade da grande imprensa e de covardia de seus adversários políticos, (ainda) não estão sendo apurados, em que pese a CPI aprovada pela Câmara dos Deputados para esse fim, a qual, segundo se sabe, deverá ser instalada no início do próximo ano, na volta dos trabalhos do Congresso.
Como o tema é a eleição em São Paulo, o que se tem que analisar é que tudo o que está acontecendo se deve a que a cidade cometeu um erro fatal em 2004 e outro ainda maior em 2008 e tais erros lhe cobraram um alto preço.
Marta Suplicy foi eleita em 2000 com a missão de reparar a devastação praticada por Paulo Maluf e Celso Pitta na prefeitura ao longo da década de 1990, quando protagonizaram o primeiro grande erro dos paulistanos, o de negar voto a Eduardo Suplicy, indicado por Luiza Erundina, que fizera trabalho saneador da cidade após outra gestão catastrófica, a de Jânio Quadros, que, a exemplo das de Maluf, Pitta, José Serra e Gilberto Kassab, viu máfias se instalarem por toda a administração municipal.
Por omissão criminosa da grande imprensa paulista, São Paulo não sabe que a gestão Kassab está sob “sub judice”, com vários secretários e o próprio prefeito sendo acusados e investigados pelo Ministério Público por conta das novas máfias que se instalaram na administração municipal de forma a, por exemplo, lucrar com a liberação de construção de imóveis.
A mídia que a ditadura militar legou ao Brasil, porém, escondeu tudo isso do eleitor paulistano no âmbito de sua luta insana contra o Partido dos Trabalhadores, que já remonta a quase a um quarto de século (desde 1989).
Todavia, ainda em 2004, quando a excelente gestão Marta foi interrompida aos meros quatro anos (os grupos políticos de direita que governaram a cidade tiveram todos oito anos) assim como ocorreu com a de Erundina, já se sabia que a retomada das práticas criminosas e socialmente irresponsáveis que a direita iria impor à cidade cobrariam desta um preço, de forma que a conscientização do paulistano sobreviria, se não pelo amor (racionalidade), ao menos pela dor.
A cidade, pois, foi entregue a dois homens que utilizariam a administração municipal como trampolim para seus projetos políticos. Serra ficou no cargo pouco mais de um ano, pois se candidatou a prefeito em 2004 apenas para ganhar musculatura e recursos para disputar o governo do Estado dois anos depois, governo que também abandonaria para disputar a Presidência da República em 2010.
Kassab, assim como o padrinho político, também abandonou São Paulo na mão de assessores corruptos para montar um partido político, o PSD, que reúne, se não o que de pior havia no PSDB e no DEM, boa parte do lixo político que infecta esses partidos.
Enquanto Serra e Kassab se dedicavam aos seus projetos políticos, o caos foi se implantando na capital paulista. Violência, criminalidade, falta de mobilidade urbana, sujeira, abandono da população de rua (que explodiu), serviços públicos de quinto mundo, piores salários de servidores municipais, corrupção desbragada… Ufa! São Paulo, que quando Marta deixou o governo era uma cidade complicada, chegou ao inferno.
E a São Paulo de hoje não é ruim apenas para os pobres, apesar de, para estes, ser muito pior. É ruim também para os ricos. A cidade viu, nessa administração nefasta que caminha para o ostracismo e para a vergonha histórica, ocorrerem até o que nunca antes ocorrera: enchentes em bairros ditos “nobres”. Isso sem falar que a cidade é hoje uma praça de guerra com dezenas de assassinatos todos os dias, sobretudo à noite.
A eleição de Fernando Haddad é, portanto, o primeiro passo para tirar não só a capital paulista das mãos da quadrilha demo-tucano-midiática, mas, sobretudo, o governo do Estado, pois São Paulo está encolhendo diante de um Brasil que cresce e se desenvolve como nunca se viu, tudo graças a um grupo político que governa fechando as portas às políticas públicas do governo federal que estão fazendo outras regiões progredirem muito mais.
O povo de São Paulo precisou passar pela autoflagelação que se impôs com a eleição do atual grupo político que governa a cidade de forma a acordar. E, repito, se não foi pelo amor, foi pela dor que amadureceu, pois eleição é coisa séria, não pode ser confundida com as disputas retóricas do futebol, mas o paulistano, instigado pela mídia partidarizada e irresponsável, vinha votando com o fígado em vez de votar com o cérebro.

Se urna pode condenar, também pode absolver

Desde que, acima de qualquer outra, a vitória de Fernando Haddad ameaçou comprovar que o povo brasileiro não acredita na orgia midiática em torno do julgamento do mensalão, os mesmos pistoleiros da mídia que previram que o PT, além de ser “condenado” pelo Supremo Tribunal Federal, também seria condenado pelas urnas, mudaram o discurso.
Não há colunista, editorialista ou veículo integrante do Partido da Imprensa Golpista que, antes de se configurar a imensa vitória eleitoral que o PT teve em 2012, não tenha dito que as urnas se coadunariam com a mídia e com o tribunal de exceção de forma a condenarem o PT.
Após 7 de outubro, quando o PT se tornou, mais uma vez, o partido mais votado do Brasil ao mesmo tempo em que o conclave demo-tucano-midiático-judiciário mandava o Estado de Direito às favas e inaugurava a era dos presos políticos no país, esses pistoleiros da opinião passaram a dizer que “urnas não absolvem” o PT, como se este estivesse sendo julgado.
O PT não foi a julgamento, mas se o veredicto das urnas, segundo a pistolagem midiática, servia para condenar o partido, por que é, diabos, que não serve para absolver?
Pergunte-se, leitor, o que o PIG estaria dizendo se o PT tivesse sido arrasado eleitoralmente em todo o país. As manchetes, inequivocamente, seriam no sentido de que o povo, assim como o STF, condenou os “mensaleiros”, o PT e Lula, ainda que estes dois últimos não tenham sido sequer acusados formalmente. Portanto, as urnas absolveram, sim, Lula e o PT.

Extraido do blog "Conversa Afiada"

Publicado em 27/10/2012

Em duvida pró réu.
Era uma vez …

Não pode passar sem registro um outro aspecto extraído ou confirmado pelo julgamento do mensalão: o poder da mídia para capturar a vaidade humana e torná-la sua refém.

Saiu na Folha (*):

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/74313-o-destino-do-quotin-dubio-pro-reoquot.shtml


A jurisprudência do mensalão cria precedentes perigosos na segurança processual e nos direitos do acusado?

sim


O destino do “in dubio pro reo”


Alvo de televisionamento, contendo o envolvimento de figuras proeminentes do mundo político, financeiro e publicitário. Colocado como um julgamento do comportamento ético de um partido político e dos seus governos. Posto como teste da imparcialidade do STF, pois a maioria dos seus integrantes foi nomeada pelos dois últimos governos. Envolvendo a sedimentada ideia de que no país as classes privilegiadas não são punidas.

O julgamento do chamado mensalão, com tudo isso, deixará marcas profundas no comportamento dos que operam o direito, como nos tribunais inferiores, e no próprio (in)consciente coletivo. Assim, certos aspectos de maior repercussão podem ser apontados, sem embargo de outros e dos efeitos do julgamento que só o futuro mostrará.

Para alguns ministros, nos crimes de difícil comprovação, o juiz não precisa de provas cabais, bastando indícios ou até a sua percepção pessoal para proferir uma condenação.

Em outras palavras, permite-se que o magistrado julgue por ouvir dizer, com base na verdade tida como sabida, mas não provada. Estará assim, na verdade, julgando com os sentidos e não com as provas.

É da tradição do direito penal dos povos civilizados a necessidade da certeza para uma condenação. Caso o juiz não tenha a convicção plena da responsabilidade do acusado, deverá absolve-lo. Trata-se do consagrado “in dubio pro reo” -na dúvida, absolve-se. Mais do que jurídica, essa máxima atende ao anseio natural de liberdade e de justiça. Não é justo punir-se com dúvida.

Alguns ministros, porém, pregaram a responsabilidade objetiva, com desprezo ao comportamento e à vontade do acusado.

Autoria criminal implica em um comportamento comissivo ou omissivo e na vontade dirigida à prática criminosa. Exemplificando para explicar: a condição pessoal, digamos, do dirigente de uma empresa, por si só, não o torna culpado por crimes cometidos em prol de tal empresa.

Utilizou-se a teoria já antiga do domínio do fato para justificar punições incabíveis. No entanto, ao contrário do propalado, essa teoria exige justamente que o autor vincule-se ao crime pela ação e pela vontade de agir criminosamente.

Alguns pronunciamentos trouxeram preocupante imprecisão ao conceito de lavagem de dinheiro. Consiste na conduta utilizada para emprestar aparente licitude ao produto de um crime, ocultando e dissimulando a sua origem. Há a necessidade de uma ação concreta, diversa do crime anterior.

No entanto, alguns julgadores, de forma imprecisa, parecem querer considerar lavagem a mera utilização do produto do outro delito.

Usar o dinheiro sem a simulação de sua origem não é lavagem, mas natural decorrência do crime patrimonial. Considerar o mero uso como outra figura penal é admitir crime sem conduta própria e permitir dupla punição a só uma ação.

A sociedade não ficou inerte e nem apática. Reagiu ao julgamento, em regra aplaudindo condenações e criticando absolvições. Conclui-se que a expectativa é pela culpa e não pela inocência. Isso é fruto da disseminação de uma cultura punitiva, de intolerância raivosa e vingativa, que tomou conta da nossa sociedade, fazendo-a apenas clamar por punição, sem pensar em prevenir o crime, combater suas causas.

Não pode passar sem registro um outro aspecto extraído ou confirmado pelo julgamento do mensalão: o poder da mídia para capturar a vaidade humana e torná-la sua refém.

Nesse sentido, um alerta: todos nós, integrantes da cena judiciária, deveremos administrar as nossas vaidades, para que ela não se sobreponha às responsabilidades que temos para com o seu principal protagonista, o cidadão jurisdicionado.

ANTONIO CLÁUDIO MARIZ DE OLIVEIRA, 67, é advogado criminalista. Foi presidente da OAB-SP (1987-1990) e defende Ayanna Tenório no julgamento do mensalão ( o do PT).

São Paulo e Campinas/ resposta do povo ao STF ? CARTA MAIOR


Política| 27/10/2012 | Copyleft

Neste domingo, o Brasil se chama São Paulo

Em São Paulo e em Campinas, o eleitor foi apresentado a dois candidatos do PT que deram rosto a algo que faz sentido nas suas vidas. Assim não fosse, essas candidaturas não se sustentariam. Uma prova da fragilidade das imagens descarnadas é o desastre espetacular chamado Russomano, um pedagógico exemplo de que rosto e espetáculo não constituem nem ameaçam o poder. É porque o que eles representam faz sentido e está presente nas vidas dos eleitores que as suas candidaturas não apenas cresceram, como floresceram e apontam para uma inesperada e bem vinda renovação do PT, e justamente no estado de São Paulo, o reduto da hoje crepuscular oposição.

Prestem atenção, nem que por misericórdia, nestas afirmações: Lula é o grande derrotado das eleições de 2012; o grande vencedor é Eduardo Campos, ele foi até assunto na The Economist; o PT acabou: o julgamento do mensalão pôs um fim à hegemonia que saqueou o estado brasileiro e mergulhou a sociedade num pesadelo de corrupção; você vai querer me dizer que o PT é inocente? Ora veja, para condenar alguém, numa acusação de quadrilha, não se precisa de prova direta e, vale dizer, boato e fofoca têm a mesma eficácia de prova direta. Quantos anos de cadeia para esses corruptos? 40, 15, muito pouco. Vejam, Dilma não pode ser confundida com Lula: o seu governo é medíocre e a sua possibilidade de acumular votos ou apoio não pode depender de um partido que está praticamente derrotado e será destruído, com o julgamento do mensalão. Agora, Aécio entrou de vez na campanha municipal deste ano; Aécio, não um poste qualquer, uma pessoa que nada tem a ver com o jogo, um neófito, esse Márcio Pochmann, por exemplo.

Nenhuma dessas coisas foi inventada por mim. Todas foram ditas, com mais ou menos literalidade, pelos colunistas políticos que se dedicam, segundo falam, a noticiar e comentar os principais “fatos” políticos. A relação semântica entre o que é dito acima e a realidade político-eleitoral que se encerra amanhã, no Brasil, é de pane total. Uma perspectiva ingênua, crente no sonho de Montesquieu da tripartição dos poderes do estado, poderia argumentar que a independência do judiciário em relação ao andar das coisas no executivo e no legislativo do país explicaria a aparente falta de relação entre esse julgamento e o atual processo eleitoral. Mas se tem uma coisa que ninguém que pretenda respeitar o esclarecimento pode reivindicar, a título de qualquer tentativa de defesa, a estas alturas, é a ingenuidade.

A inocência é o pior dos defeitos que se pode cultivar na luta pelo esclarecimento. Se tem algo de irredutível na experiência de dois mandatos e meio do PT na presidência da república é isso. A Política, como se sabe, habita e contamina o reino que se situa entre a inocência perdida e a delinquência negada. Não é requerido e é mesmo indevido que se espere que monopólios ou veículos de comunicação que emprestam carros a sessões de tortura digam a verdade ou tenham respeito pela realidade. Monopólio e tortura são propriedades da delinquência. Tampouco é requerido e menos ainda devido que se abrace a delinquência em nome de uma amadurecida não-inocência inventada como presente em algum momento do passado do PT ou da esquerda. Quer dizer, não é a Rede Globo e a Folha de São Paulo que devem ser exigidos e denunciados como delinquentes, enquanto se louva o obscurantismo inventado para combater uma inocência jamais havida. É com isso em mente que faz sentido dizer que é o governo federal, na terceira gestão de um projeto político, o grande vencedor com a sigla partidária do PT, nestas eleições.

E é em São Paulo e em Campinas que essa tese ganha força. É em duas candidaturas oriundas não do PT como partido político, mas das experiências Lula e Dilma, que se torna irredutível o tamanho da vitória que se avizinha. Demorou, mas o Brasil chegou em São Paulo e, neste domingo, as duas maiores cidades do estado de São Paulo e uma das maiores cidades do mundo se aproximam de uma eleição nacional. Amanhã, o nome do Brasil é São Paulo. E não é justo nem verdadeiro dizer que Lula é o grande vencedor destas duas irredutíveis vitórias políticas, a serem eleitoralmente confirmadas, neste domingo.

Fernando Haddad e Márcio Pochmann podem se tornar prefeitos não porque Lula os escolheu e os pôs lá, como fossem bonecos ou “postes”. Esses dois doutores, oriundos da universidade pública brasileira, são de uma geração política que se tornou dirigente nos governos petistas de Marta (caso de Pochmann) e de Lula.

Haddad se tornou conhecido porque foi um bom ministro da Educação. Pochmann, porque transformou o IPEA e porque, em momento algum, parou de pensar o tamanho dos problemas do país que acompanham ou interpelam os seus avanços. Haddad é o gestor responsável pela mudança na universidade brasileira e na relação desta com a cidadania. Será preciso décadas ainda para que o impacto das cotas, da ampliação dos campi e do número de vagas nas universidades públicas e do PROUNI seja analisado com o tamanho e a força civilizatória devidos. Por ora, o que há são dados preliminares e uma mudança de paisagem e de produtividade no ensino e pesquisa universitária brasileira, que poderiam estar melhor, com servidores e professores mais bem remunerados, mas que, de fato, saiu da treva em que o tucanato os tinha afundado.

Pochmann se tornou conhecido por sua atividade intelectual e como pesquisador, sobretudo a partir da presidência bem sucedida no IPEA. E isso, por si só, torna a sua candidatura extraordinária; é como se a República de Platão fosse, de uma maneira a um só tempo promissora e historicizada, instanciada numa candidatura que abraça o líder popular e a atual presidenta e defende como programa de governo “uma cidade do conhecimento”.

Sim, é preciso uma certa misericórdia para escutar ou ler ou assistir à turma que comunica e desinforma a respeito desses fatos. O que a candidatura de Haddad e a de Pochmann representam não é o PT, apenas, não é a esquerda, enquanto tal; eles representam uma experiência de governo: as suas campanhas são campanhas que se estruturam com programas referidos e reivindicados num governo, numa experiência governamental. Lula e Dilma são cabos eleitorais porque eles, os candidatos, trabalharam junto, num governo, isso mesmo, num governo.

Nada nesse processo é trivial e menos ainda comum. Nunca aconteceu algo assim, dessa dimensão, em tão longevo período de estabilidade democrática, dentro das regras do jogo, portanto.

Em São Paulo e em Campinas, o eleitor foi apresentado a dois candidatos do PT que deram rosto a algo que faz sentido nas suas vidas. Assim não fosse, essas candidaturas não se sustentariam. Uma prova da fragilidade das imagens descarnadas é o desastre espetacular chamado Russomano, um pedagógico exemplo de que rosto e espetáculo não constituem nem ameaçam o poder. É porque o que eles representam faz sentido e está presente nas vidas dos eleitores que as suas candidaturas não apenas cresceram, como floresceram e apontam, hoje, para uma inesperada e bem vinda renovação do PT, e justamente no estado de São Paulo, o reduto da hoje crepuscular oposição.

Mais um depoimento intelectual sobre o Brasil

por Ramatis Jacino
Negros que escravizam e vendem negros na África, não são meus irmãos
Negros senhores na América a serviço do capital, não são meus irmãos
Negros opressores, em qualquer parte do mundo, não são meus irmãos...
Solano Trindade
O racismo, adotado pelas oligarquias brasileiras para justificar a exclusão dos negros no período de transição do modo de produção escravista para o modo de produção capitalista, foi introjetado pelos trabalhadores europeus e seus descendentes, que aqui aportaram beneficiados pelo projeto de branqueamento da população brasileira, gestado por aquelas elites.
Impediu-se, assim, alianças do proletariado europeu com os históricos produtores da riqueza nacional, mantendo-os com ações e organizações paralelas, sem diálogos e estratégias de combate ao inimigo comum. Contudo, não há como negar que o conjunto de organizações sindicais, populares e partidárias, além das elaborações teóricas classificadas como “de esquerda”, sejam aliadas naturais dos homens e mulheres negros, na sua luta contra o racismo, a discriminação e a marginalização a que foram relegados.
No campo oposto do espectro ideológico e social, as organizações patronais, seus partidos políticos e as teorias que defendem a exploração do homem pelo homem, que classificamos de “direita”, se baseiam na manutenção de uma sociedade estamental e na justificativa da escravidão negra, como decorrência “natural” da relação estabelecida entre os “civilizados e culturalmente superiores europeus” e os “selvagens africanos”.
É equivocada, portanto, a frase de uma brilhante e respeitada filósofa negra paulistana de que “entre direita e esquerda, eu sou preta”, uma vez que coloca no mesmo patamar os interesses de quem pretende concentrar a riqueza e poder e àqueles que sonham em distribuí-la e democratizá-la. Afirmação esta, que pressupõe alienação da população negra em relação às disputas políticas e ideológicas, como se suas demandas tivessem uma singularidade tal que estariam à margem das concepções econômicas, de organização social, políticas e culturais, que os conceitos de direita e esquerda carregam.
As elites brasileiras sempre utilizaram indivíduos ou grupos, oriundos dos segmentos oprimidos para reprimir os demais e mantê-los sob controle. Capitães de mato negros que caçavam seus irmãos fugidos, capoeiristas pagos para atacarem terreiros de candomblé, incorporação de grande quantidade de jovens negros nas polícias e forças armadas, convocação para combater rebeliões, como a de Canudos e Contestado, são exemplos da utilização de negros contra negros ao longo da nossa história.
Havia entre eles quem acreditasse ter conquistado de maneira individual o espaço que, coletivamente, era negado para o seu povo, iludindo-se com a idéia de que estaria sendo aceito e incluído naquela sociedade. Ansiosos pela suposta aceitação, sentiam necessidade de se mostrarem confiáveis, cumprindo a risca o que se esperava deles, radicalizando nas ações, na defesa dos valores dos poderosos e da ideologia do “establishment” com mais vigor e paixão do que os próprios membros das elites. A tragédia, para estes indivíduos – de ontem e de hoje -, se estabelece quando, depois de cumprida a função para a qual foram cooptados são devolvidos à mesma exclusão e subalternidade social dos seus irmãos.
São inúmeros os exemplos deste descarte e o mais notório é a história de Celso Pitta, eleito prefeito da maior cidade do país, apoiado pelos setores reacionários, com a tarefa de implementar sua política excludente.
Depois de alçado aos céus, derrotando uma candidata de esquerda que, quando prefeita privilegiou a população mais pobre – portanto, negra – foi atirado ao inferno por aqueles que anteriormente apoiaram sua candidatura e sua administração. Execrado pela mídia que ajudou a elegê-lo, abandonado por seus padrinhos políticos, acabou processado e preso, de forma
humilhante, de pijama, algemado em frente às câmeras de televisão. Morreu no ostracismo, sepultado física e politicamente, levando consigo as ilusões daqueles que consideram que a questão racial passa ao largo das opções político/ideológicas.
A esquerda, por suas origens e compromissos, em que pese o fato de existirem pessoas racistas que se auto intitulam de esquerda, comporta-se de maneira diversa: foi um governo de esquerda que nomeou cinco ministros de Estado negros; promulgou a lei 10.639, que inclui a história da África e dos negros brasileiros nos currículos escolares; criou cotas em universidades públicas; titulou terras de comunidades quilombolas e aprofundou relações diplomáticas, econômicas e culturais com o continente africano.
Joaquim Barbosa se tornou o primeiro ministro negro do STF como decorrência do extraordinário currículo profissional e acadêmico, da sua carreira e bela história de superação pessoal. Todavia, jamais teria se tornado ministro se o Brasil não tivesse eleito, em 2003, um Presidente da República convicto que a composição da Suprema Corte precisaria representar a mistura étnica do povo brasileiro.
Com certeza, desde a proclamação da República e reestruturação do STF, existiram centenas, talvez milhares de homens e mulheres negras com currículo e história tão ou mais brilhantes do que a do ministro Barbosa.
Contudo, nunca passou pela cabeça dos presidentes da República – todos oriundos ou a serviço das oligarquias herdeiras do escravismo – a possibilidade de indicar um jurista negro para aquela Corte. Foi necessário um governo de esquerda, com todos os compromissos inerentes à esquerda verdadeira, para que seu mérito fosse reconhecido.
A despeito disso, o ministro Barbosa, em uníssono com o Procurador Geral da República, considera não haver necessidade de provas para condenar os réus da Ação Penal 470. Solidariza-se com as posições conservadoras e evidentemente ideológicas de alguns dos demais ministros e, em diversas ocasiões procura ser “mais realista do que o próprio rei”.
Cumpre exatamente o roteiro escrito pela grande mídia ao optar por condenar não uma prática criminosa, mas um partido e um governo de esquerda em um julgamento escandalosamente político, que despreza a presunção de inocência dos réus, do instituto do contraditório e a falta de provas, como explicitamente já manifestaram mais de um dos integrantes daquela Corte.
Por causa “desses serviços prestados” é alçado aos céus pela mesma mídia que, faz uma década, milita contra todas as iniciativas promotoras da inclusão social protagonizadas por aquele governo, inclusive e principalmente, àquelas que tentam reparar as conseqüências de 350 anos de escravidão e mais de um século de discriminação racial no nosso país.
O ministro vive agora o sonho da inclusão plena, do poder de fato, da capacidade de fazer valer a sua vontade. Vive o sonho da aceitação total e do consenso pátrio, pois foi transformado pela mídia em um semideus, que “brandindo o cajado da lei, pune os poderosos”.
Não há como saber se a maximização do sonho do ministro Joaquim Barbosa é entrar para a história como um juiz implacável, como o mais duro presidente do STF ou como o primeiro presidente da República negro, como já alardeiam, nas redes sociais e conversas informais, alguns ingênuos, apressados e “desideologizados” militantes do movimento negro.
O fato é que o seu sonho é curto e a duração não ultrapassará a quantidade de tempo que as elites considerarem necessário para desconstruir um governo e um ex-presidente que lhes incomoda profundamente.
Elaborar o maior programa de transferência de renda do mundo, construir mais de um milhão de moradias populares, criar 15 milhões de empregos, quase triplicar o salário mínimo e incluir no mercado de consumo 40 milhões de pessoas, que segundo pesquisas recentes é composto de 80% de negros, é imperdoável para os herdeiros da Casa Grande. Contar com um ministro negro no Supremo Tribunal Federal para promover a condenação daquele governo é a solução ideal para as elites, que tentam transformá-lo em instrumento para alcançarem seus objetivos.
O sonho de Joaquim Barbosa e a obsessão em demonstrar que incorporou, na íntegra, as bases ideológicas conservadoras daquele tribunal e dos setores da sociedade que ainda detém o “poder por trás do poder” está levando-o a atropelar regras básicas do direito, em consonância com os demais ministros, comprometidos com a manutenção de uma sociedade excludente, onde a Justiça é aplicada de maneira discricionária.
A aproximação com estes setores e o distanciamento dos segmentos a quem sua presença no Supremo orgulha e serve de exemplo, contribuirão para transformar seu sonho em pesadelo, quando àqueles que o promoveram à condição de herói protagonizarem sua queda, no momento que não for mais útil aos interesses dos defensores do “apartheid social e étnico” que ainda persiste no país.
Certamente não encontrará apoio e solidariedade nos meios de esquerda, que são a origem e razão de ser daquele que, na Presidência da República, homologou sua justa ascensão à instância máxima do Poder Judiciário. Dos trabalhadores das fábricas e dos campos, dos moradores das periferias e dos rincões do norte e nordeste, das mulheres e da juventude, diretamente beneficiados pelas políticas do governo que agora é atingido injustamente pela postura draconiana do ministro, não receberá o apoio e o axé que todos nós negros – sem exceção – necessitamos para sobreviver nessa sociedade marcadamente racista.
Ramatis Jacino é professor, mestre e doutorando em História Econômica pela USP e presidente do INSPIR – Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Depois de Malafaia, Serra evoca Lombroso




Quem achava que depois da caça ao kit gay estaria esgotado o estoque de excrescências desta campanha, errou. A quatro dias das eleições municipais de 2012, Serra revira seus guardados no saco do desespero. Elege um truque por dia. Enfia os pés pelas mãos. Como se tentasse correr na areia movediça, transforma sua campanha num atoleiro. Desta vez foi fundo demais.

Os impulsos que o desespero desencadeia provocam calafrios em círculos tucanos mais serenos. A essa altura, tudo o que pedem é que o 28 de outubro chegue logo.

Nesta terça-feira, em entrevista à amigável rádio CBN (emissora das organizações Globo), o candidato que trouxe o obscurantismo religioso ao centro da disputa, ungindo Silas Malafaia em assessor para os bons costumes, metabolizou Cesare Lombroso.

O tucano - se eleito - pretende criar nada menos que um programa de monitoramento de jovens com 'propensão' para cometer crimes.

Em resumo, criminalizar antes aqueles que se considere potencialmente criminosos.

Como? Acompanhe. Seria um braço da Febem agindo, secretamente supõe-se, dentro das escolas das periferias, naturalmente.

Objetivo: vigiar jovens que, nas palavras do candidato José Serra: "Ainda não entraram para o mundo do crime (frise-se o 'ainda'), "mas que podem ter propensão para isso".

E arremata, algo assustador: "Vamos fazer um trabalho preventivo, de identificar quem tem potencial para ir para o crime ou para a droga"

O teor de higenismo social intrínseco a esse projeto deixa o feito anterior de Serra, as rampas anti-mendigo, lançadas quando passou pela prefeitura em 2006, no chinelo das aberrações conservadoras. Que não são poucas.

Alguém já pensou isso antes.

Combater o crime identificando preventivamente o criminoso foi o propósito do criminologista e psiquiatra italiano, Cesare Lombroso (1835-1909), que se dedicou ao estudo da antropologia criminal.

Serra, se eleito, poderá queimar etapas e recorrer à tipificação antropológica feita por Lombroso. O propósito de ambos é o mesmo: liquidar o mal pela raiz.

A raiz, como se sabe da visão conservadora, está no indivíduo, não na sociedade; esta deve ser preservada.

Os famintos são culpados pela sua fome, não as instituições.

O desemprego só existe porque os preguiçosos se recusam a pegar no batente pelo salário disponível no mercado autorregulável . Etc.

Antes que a juventude pobre cause embaraços --e a exemplo do que se pretendeu com as rampas anti-mendigo, instaladas sob viadutos e calçadas de bairros elegantes -- vamos então tipificá-la.

A coisa começa por aí.

O precursor italiano de Serra, Cesare Lombroso, apregoava que o delinqüente possuía características natas, tais como: protuberância occipital, órbitas grandes, testa fugidia, arcos superciliares excessivos, zigomas salientes, prognatismo inferior, nariz torcido, lábios grossos, arcada dentária defeituosa, braços excessivamente longos, mãos grandes, orelhas grandes etc etc

Desenvolvida a partir da observação de prisioneiros e internos em manicômios, a teoria lombrosiana define que a biologia estampa o destino social do ser humano. Deixa tudo mais fácil: a pessoa é vigiada e punida pelo que a fisionomia antecipa que será a sua sorte. Sem nuances ou mediações históricas.

Assim como as prisões em que Lombroso concluiu sua 'tipificação', as escolas das periferias em que Serra pretende vigiar também estão lotadas de pobres.

Serra, a exemplo de seguidores de Lombroso, não tardará assim a identificar nos pobres as características congênitas do crime e do criminoso.

O resto deixa com o Coronel Telhada.

O vereador eleito pelo PSDB, famoso comandante linha dura da Rota, foi elogiado recentemente por Serra.O tucano identificou no trabalho de quem perdeu a conta de quantos matou um esforço "comprometido com os direitos humano' .

Do que mais será capaz esse astuto rapaz? Oremos pelo dia 28.
Postado por Saul Leblon às 07:33

Eric Nepomuceno/Argentina/ Jornal pagina 12

Política| 24/10/2012 | Copyleft

"STF condenou Dirceu e Genoino sem apresentar uma só prova"

Tal como se temia, o STF se deixou influenciar pela pressão externa e politizou um processo que deveria ser jurídico. A única surpresa foi a atmosfera de espetáculo criada pelos integrantes da Corte. Além da transmissão das sessões ao vivo pela televisão, propiciando um nutrido desfile de egos inflados, exibições de erudição jurídica e aulas de moral e bons costumes, o que se viu foi uma rajada de inovações na interpretação a aplicação de alguns pilares básicos do Direito. Para começar, se aboliu a exigência de provas para condenar parte dos acusados. O artigo é de Eric Nepomuceno.

(*) Artigo publicado originalmente no jornal Página/12, da Argentina.

Rio de Janeiro - O mais ruidoso e pressionado julgamento da história recente da Corte máxima do Brasil está chegando ao seu final. Os condenados buscarão brechas para apelas das sentenças, enquanto juristas e analistas políticos tratam de medir as consequências do que ocorreu até aqui.

A única coisa que falta agora é o Supremo Tribunal Federal brasileiro estabelecer as penas dos condenados. Foi um julgamento atípico, que transcorreu sob a insólita pressão dos meios de comunicação, com o aplauso frenético de setores das classes médias conduzidas pela mão dos grandes grupos midiáticos e que termina sem maiores surpresas. Tal como se temia, o STF se deixou influenciar pela pressão externa e politizou um processo que deveria ser exclusivamente jurídico.

A única surpresa foi a atmosfera de grande espetáculo público criada pelos próprios integrantes da Corte. Além da transmissão das sessões ao vivo pela televisão, propiciando ao respeitável público um nutrido desfile de egos inflados, exibições de erudição jurídica e aulas de moral e bons costumes, o que se viu foi uma rajada de inovações na interpretação a aplicação de alguns pilares básicos do Direito.

Para começar, se aboliu a exigência de provas para condenar parte dos acusados. Ficou estabelecido o preocupante precedente que permite que, na hora de julgar, se aceite ilações, suposições, e que a Corte se deixe induzir pela pressão midiática, que permita que os trabalhos sejam politizados.

Alguns dos magistrados chegaram a condenar, em seus votos, os malefícios das alianças formadas para que exista um governo de coalizão. Ou seja, mais do que julgar supostos crimes e delitos, se deram ao luxo de julgar a própria política.

Ficou estabelecido, além disso, que aos senhores juízes está permitido, na hora de emitir voto e sentença, exibir rotundas doses de sarcasmo, em comentários que mostram muito mais seus rancores e traços ideológicos do que equilíbrio e equidade.

Essas inovações surgiram com ímpeto na hora de julgar o chamado “núcleo político” do esquema de distribuição de dinheiro para cobrir gastos da campanha política de 2002, que além de eleger governadores, deputados nacionais e senadores, levou Luiz Inácio Lula da Silva e seu Partido dos Trabalhadores à presidência da República.

O caudaloso fluxo de dinheiro não declarado é uma prática velha – e por certo muito condenável – na política brasileira. Mas, ao menos até agora, era um assunto da Justiça Eleitoral.

A peça acusatória, levada ao Supremo Tribunal Federal pelo Ministério Público, assegurava que, mais do que essa velha prática, tratou-se da compra de votos de parlamentares para que fossem aprovados projetos legislativos de interesse do governo. Não houve nem há nenhuma prova minimamente concreta disso. Acusou-se o PT e seu então presidente, José Genoino, por alguns empréstimos bancários. O PT provou que os empréstimos foram registrados, de acordo com a legislação eleitoral, renegociados e, finalmente, pagos. Acusou-se José Dirceu, homem forte do partido e estrategista da vitória de Lula, de ter engendrado um esquema de compra de parlamentares.

Um dos “argumentos” da acusação foi dizer que, como chefe da Casa Civil, ele recebia dirigentes políticos aliados do governo, como se não fosse exatamente essa sua função. Não há uma miserável prova nem de sua participação nem da existência de tal esquema.

Há, isso sim, evidências e indícios concretos de desvio de fundos públicos, principalmente do setor de comunicação e publicidade do Banco do Brasil e um intenso jogo de interesses por parte da banca que repassou fundos ao tesoureiro do PT. Mas não houve nem há uma única e solitária prova de que as duas principais figuras políticas acusadas, José Genoino e José Dirceu, tivessem participado da trama.

A última condenação de Dirceu, por formação de quadrilha – a outra foi por corrupção ativa – resultou de uma decisão dividida (seis votos a quatro), o que, ao menos em tese, lhe dá o direito de apresentar recurso contra a decisão. Na condenação por corrupção ativa, não: teve dois votos favoráveis e oito contrários.

Seja como for, as consequências políticas do julgamento ainda não se fizeram sentir. Pelo contrário: nas últimas eleições, o PT conseguiu aumentar seu caudal de votos e está a ponto de reconquistar a prefeitura de São Paulo, derrotando mais uma vez a José Serra, que, em duas ocasiões, teve seus sonhos presidenciais fulminados, a primeira por Lula em 2002 e a segunda por Dilma Rousseff em 2010.

Nem Dirceu nem Genoino deixarão de ter peso específico nas decisões do partido. Dirceu, especialmente, seguirá sendo um dirigente de forte expressão, apesar de ser brutalmente hostilizado e vilipendiado pela grande imprensa e pelas classes médias ávidas por extirpar do horizonte político o PT, Lula e a esquerda em geral.

Juridicamente, será preciso esperar para ver até que ponto as esdrúxulas inovações desse julgamento midiático, transcorrido sob pressões inéditas, criarão jurisprudência no futuro. A essa altura, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, principalmente o relator do processo, Joaquim Barbosa, contam com o aplauso iracundo dos grandes meios de comunicação e de setores das classes médias. É preciso ver quanto tempo durará essa euforia.

Enquanto isso, a impunidade dos poderosos segue intacta no Brasil. Os métodos delituosos de financiamento das campanhas eleitorais, também. E dois veteranos combatentes das lutas populares, José Dirceu e José Genoino, que nos tempos da ditadura foram vítimas de tribunais de exceção (o primeiro foi expulso do país, o outro sofreu cinco anos de prisão e tortura), são agora vítimas de um julgamento de exceção.

Há uma assustadora diferença: antes havia uma ditadura. Agora, se vive em democracia. Todo o resto, para eles, tem sido igual, ou quase. Ao menos, desta vez, a tortura não é física.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Sempre CARTA MAIOR

Depois de Malafaia, Serra evoca Lombroso




Quem achava que depois da caça ao kit gay estaria esgotado o estoque de excrescências desta campanha, errou. A quatro dias das eleições municipais de 2012, Serra revira seus guardados no saco do desespero. Elege um truque por dia. Enfia os pés pelas mãos. Como se tentasse correr na areia movediça, transforma sua campanha num atoleiro. Desta vez foi fundo demais.

Os impulsos que o desespero desencadeia provocam calafrios em círculos tucanos mais serenos. A essa altura, tudo o que pedem é que o 28 de outubro chegue logo.

Nesta terça-feira, em entrevista à amigável rádio CBN (emissora das organizações Globo), o candidato que trouxe o obscurantismo religioso ao centro da disputa, ungindo Silas Malafaia em assessor para os bons costumes, metabolizou Cesare Lombroso.

O tucano - se eleito - pretende criar nada menos que um programa de monitoramento de jovens com 'propensão' para cometer crimes.

Em resumo, criminalizar antes aqueles que se considere potencialmente criminosos.

Como? Acompanhe. Seria um braço da Febem agindo, secretamente supõe-se, dentro das escolas das periferias, naturalmente.

Objetivo: vigiar jovens que, nas palavras do candidato José Serra: "Ainda não entraram para o mundo do crime (frise-se o 'ainda'), "mas que podem ter propensão para isso".

E arremata, algo assustador: "Vamos fazer um trabalho preventivo, de identificar quem tem potencial para ir para o crime ou para a droga"

O teor de higenismo social intrínseco a esse projeto deixa o feito anterior de Serra, as rampas anti-mendigo, lançadas quando passou pela prefeitura em 2006, no chinelo das aberrações conservadoras. Que não são poucas.

Alguém já pensou isso antes.

Combater o crime identificando preventivamente o criminoso foi o propósito do criminologista e psiquiatra italiano, Cesare Lombroso (1835-1909), que se dedicou ao estudo da antropologia criminal.

Serra, se eleito, poderá queimar etapas e recorrer à tipificação antropológica feita por Lombroso. O propósito de ambos é o mesmo: liquidar o mal pela raiz.

A raiz, como se sabe da visão conservadora, está no indivíduo, não na sociedade; esta deve ser preservada.

Os famintos são culpados pela sua fome, não as instituições.

O desemprego só existe porque os preguiçosos se recusam a pegar no batente pelo salário disponível no mercado autorregulável . Etc.

Antes que a juventude pobre cause embaraços --e a exemplo do que se pretendeu com as rampas anti-mendigo, instaladas sob viadutos e calçadas de bairros elegantes -- vamos então tipificá-la.

A coisa começa por aí.

O precursor italiano de Serra, Cesare Lombroso, apregoava que o delinqüente possuía características natas, tais como: protuberância occipital, órbitas grandes, testa fugidia, arcos superciliares excessivos, zigomas salientes, prognatismo inferior, nariz torcido, lábios grossos, arcada dentária defeituosa, braços excessivamente longos, mãos grandes, orelhas grandes etc etc

Desenvolvida a partir da observação de prisioneiros e internos em manicômios, a teoria lombrosiana define que a biologia estampa o destino social do ser humano. Deixa tudo mais fácil: a pessoa é vigiada e punida pelo que a fisionomia antecipa que será a sua sorte. Sem nuances ou mediações históricas.

Assim como as prisões em que Lombroso concluiu sua 'tipificação', as escolas das periferias em que Serra pretende vigiar também estão lotadas de pobres.

Serra, a exemplo de seguidores de Lombroso, não tardará assim a identificar nos pobres as características congênitas do crime e do criminoso.

O resto deixa com o Coronel Telhada.

O vereador eleito pelo PSDB, famoso comandante linha dura da Rota, foi elogiado recentemente por Serra.O tucano identificou no trabalho de quem perdeu a conta de quantos matou um esforço "comprometido com os direitos humano' .

Do que mais será capaz esse astuto rapaz? Oremos pelo dia 28.
Postado por Saul Leblon às 07:33