segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Em defesa de Ruffato

Postado em 14 out 2013
Clap. clap, clap
Clap. clap, clap
Para abreviar: acho que Ruffato foi muito bem na Feira de Frankfurt ao descrever a iniquidade social brasileira. Mandei-lhe, mentalmente, um clap, clap, clap, tão logo li suas palavras.
Vejo sentido em que a direita se incomode com o quadro traçado por Rufatto. Foi ela, afinal, que levou o país para as profundezas da desigualdade social.
O golpe militar de 1964, com apoio maciço das grandes empresas de mídia, foi vital para que a sociedade brasileira se dividisse entre o 1% e os 99%.
Destruição do ensino público de qualidade, arrocho salarial, proibição de greves, extinção de um direito trabalhista vital como a estabilidade – a obra da ditadura pode-se resumir numa frase: favorecer aqueles que já eram donos de imensos, descabidos, acintosos privilégios.
O Brasil se favelizou a partir de 1964 enquanto um pequeno grupo enriqueceu brutalmente. Delfim Netto, o nome forte da economia na ditadura, alegava que o bolo tinha que crescer antes de ser distribuído.
A fala de Delfim – segundo alguns, ele nega que disse o que disse – foi uma das maiores maldades cometidas contra os brasileiros desfavorecidos, os “Zés do Povo”, como afirmava o fundador do jornal Globo, Irineu Marinho, há coisa de um século.
Fique claro, portanto: a responsabilidade pela construção de uma sociedade injusta e insustentável é, inteiramente, da direita predadora nacional.
Nos últimos anos, e isso foi adequadamente registrado por Ruffato, houve avanços no combate à desigualdade. A chegada do PT ao poder – e este é provavelmente o maior mérito do partido na condução do país – colocou enfim a desigualdade no topo da agenda.
Considere a mídia. Quando ela liderou uma cruzada contra a miséria chocante de tantos brasileiros? Nunca. Era como se o problema não existisse. Ao longo do último meio século, inúmeras campanhas foram feitas por jornais e revistas – mas para aumentar ainda mais os privilégios do grupo que representam.
Quantas vezes você leu – e lê – que os direitos trabalhistas brasileiros são absurdos? Compare-os com os que existem em países desenvolvidos socialmente, e você tem vontade de chutar a parede. Nos países nórdicos, para ficar num pequeno exemplo, as mães podem tirar mais de um ano de licença maternidade, e os pais também têm extensas folgas para ajudar a cuidar dos filhos.
Mas no Brasil a mídia cultivou tenazmente a falácia de que não teríamos uma economia competitiva com nossos modestos direitos trabalhistas. Era mentira. Na verdade, o que se buscava era uma fatia cada vez maior do bolo de que falava Delfim. A fortuna de uma pequena parcela da sociedade foi se tornando simplesmente abjeta.
Repito: obra da direita, que fracassou miseravelmente na tarefa de construir uma sociedade justa.
Desfazer os estragos da direita é o maior desafio dos governantes brasileiros hoje, amanhã, depois de amanhã etc – pertençam eles a que partido pertencerem.
Se trouxe a questão da iniquidade para o centro dos debates, o PT, nestes dez anos, promoveu avanços sociais numa velocidade aquém da esperada e da desejada. Muitos privilégios foram mantidos, ou timidamente atacados – em nome da governabilidade.
Com isso, os brasileiros continuam ainda hoje a ver coisas que gostariam de não ver – comunidades como a de Pinheirinho desalojadas selvagemente, índios tratados a pontapés, Amarildos subitamente desaparecidos para jamais retornar.
As jornadas de junho deixaram clara a insatisfação da sociedade com tudo isso. A direita tentou depois roubar a razão dos protestos, e dizer que o alvo era a “corrupção” – um velho pretexto para justificar ataque a governos populares.
Mas a indignação era contra a persistência de altos níveis de desigualdade, a despeito dos avanços – aquém dos necessários, repito — promovidos por Lula, primeiro, e Dilma, agora. “Queremos mais”, gritou a sociedade.
Foi este mesmo o grito – esplêndido — de Ruffato em Frankfurt.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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