terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Um dia na vida do BIM, o Brasileiro Indignado com a Mídia

São milhares. Dezenas de milhares. Milhões. E não param de se multiplicar.
São os BIMs, os brasileiros indignados com a mídia.
Agora mesmo: meia tonelada de cocaína é encontrada num helicóptero de um amigo de Aécio.
O BIM passou o fim de semana mal. Olhou nas bancas para ver a capa da Veja. Fitness. Nem uma só menção, na capa, ao caso, como se meia tonelada de cocaína, e no helicóptero de um senador que presidiu o Cruzeiro, fosse meia tonelada de chocolate belga no trenó do Papai Noel.
Mas meu propósito aqui é descrever um dia na vida do BIM.
Ele acorda e dá uma olhada no Reinaldo Azevedo. Sente raiva com o que lê. Mais uma vez, se gabando de ter criado “petralha”, como se tivesse feito a Comédia Humana do Balzac.
Depois passa para o Constantino. Mais um momento de raiva. Ele conseguiu falar do Lobão no Roda Vida e colocar uma foto no texto em que o Lobão segura o livro dele, Constantino. “Trapaceiro”, pensa.
Passa os olhos por um novo blogueiro, um cara que compilou frases de Olavo Carvalho num livro. “É o reaça-engraçado”, pensa. “Se é para publicar coisas de extrema direita, poderiam dar frases do Mein Kampf direto.”
Tempo de trabalhar.
No carro, BIM põe na CBN. Ouve Merval, Sardenberg e Jabor. Xinga alto no carro, num desabafo instintivo e gutural. Merval fala sobre o lulopetismo. Sardenberg anuncia o colapso econômico. Jabor diz que se avizinha a ditadura bolivariana.
BIM lamenta não ter um Frontal à mão.
No escritório, num momento mais tranquilo, vai no site da Folha. Quer saber o que Magnoli escreveu. Defendeu a prisão de Genoino.
BIM pensa em Miruna, e se pudesse daria uma bofetada em Magnoli. “Lacaio”, pensa. Depois vai para Eliane Cantanhede. Mais uma paulada nos “mensaleiros” e mais um elogio a Joaquim Barbosa. Passa os olhos por Pondé. A Revolução Francesa não existiu, lê nele.
BIM vai para o Estadão, já que ainda tem alguns minutos antes da labuta. E então lê Dora Kramer. Joaquim Barbosa é beatificado por ela. Passa pelos editoriais, e lê um que crucifica Dirceu pelo emprego num hotel.
Só não repete o grito de raiva do carro porque está no escritório. O Estadão não falou nada sobre a sonegação de 1 bilhão da Globo, e faz uma cobertura ridícula da meia tonelada de cocaína, e mesmo assim transforma o emprego de Dirceu num caso nacional.
De volta para casa, BIM mais uma vez ouve a CBN. “Só tem reaça”, se irrita. Ouve a repetição do comentário de Jabor, e quase bate por perder momentaneamente a concentração.
Chega em casa e dá uma passada pelo Jornal Nacional, para ver a que abismo Ali Kamel pôde chegar. O caso do helicóptero, como para a Veja, é tratado como se fosse uma trivialidade.
“Como seria se em vez do filho do Perrella fosse o filho do Dirceu?”, reflete. Em sua cabeça ele vê as habituais parcerias entre a Veja e o Jornal Nacional em casos do PT. A Veja dá um dossiê no sábado e, naquela noite mesmo, o Jornal Nacional repercute com estridência.
“Depois os livros de Kamel recebem louvores da Veja”, pensa BIM. “Tutti amicci.”
Do Jornal Nacional BIM vai para a Globonews. Encontra lá Marco Antônio Villa falando de seu novo livro, que trata da década perdida sob o PT.
“Uma besta”, pensa BIM. “Não acerta uma, mas mesmo assim está em todas.” BIM lembra de um vídeo em que Villa dizia que Lula seria o grande perdedor na eleição vencida afinal por Haddad.
No começo das manifestações de junho, escreveu que os protestos não significavam “nada”.
Da Globonews, BIM passou para o Jô e suas garotas. Enio Mainardi era o entrevistado. Se perguntou quem era pior, pai ou filho, Enio ou Diogo.
Tinha lido que a Globofilmes enfia entrevistados no programa do Jô, astros de algum novo filme. E no final a Globo cobra deles a tabela comercial cheia.
“Não é à toa que os Marinhos são os homens mais ricos do Brasil”, pensa BIM.
Terminado o programa, BIM está cansado e indignado.
Gasta, na sessão de análise do dia seguinte, boa parte do tempo para colocar para fora sua indignação.
O terapeuta ouve pacientemente e, no final, diz apenas: “Mas por que você simplesmente não para de dar audiência para aquela gente toda?”
Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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